quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

HERCULES MORAIS - CEU CASABLANCA (TEATRO)

Queridos e queridas de Programa Vocacional 2015! Segue artigo escrito a partir de recorte da minha dissertação de mestrado, que teve como objeto de estudo as orientações como AO de teatro, no equipamento CEU CASABLANCA (período entre 2012 e 2015). Um trabalho interdepartamental que envolveu o Instituto de Psicologia IP-USP, o Centro de Artes Cênicas CAC-USP e a Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas FFLCH-USP. 


PROGRAMA VOCACIONAL, PROCESSOS CRIATIVOS E A CONSTITUIÇÃO DO SER NO MUNDO
UM DIALÓGO ENTRE AS ARTES CÊNICAS E A PSICOLOGIA CULTURAL DIALÓGICA



Hercules Morais
hercules_morais@hotmail.com





RESUMO
Como a experiência estética pode ampliar as condições de escuta, leitura e compreensão do mundo? O objetivo foi trazer à luz o campo da criação artística como analogia da construção sensível do ser humano. E deste modo, poder refletir sobre como o trabalho artístico se relaciona com processos subjetivos, conduzindo à transformação de aspectos psicológicos dos envolvidos. Foi utilizado como material registros da atividade artístico-pedagógica do pesquisador que atua como artista-orientador do Programa Vocacional da Prefeitura da cidade de São Paulo. A forma de análise procura identificar aspectos da arte procurando observar o acontecimento artístico e suas interrelações com o sujeito inserido dentro do campo social/cultural. Serão feitas reflexões sobre os procedimentos do processo de criação que envolve a elaboração de protocolos, depoimentos, ações culturais, construção de cenas como produtos artísticos que aparecem, ressoam e ressignificam a vida cotidiana.



PALAVRAS CHAVE
DIALOGISMO, FENOMENOLOGIA, CONSTRUTIVISMO SEMIÓTICO-CULTURAL, PROCESSOS CRIATIVOS, TEATRO LABORATÓRIO: ARTES DA REPRESENTAÇÃO.




1. Apresentação

O texto que se segue nasce de minha experiência como artista orientador da linguagem de Teatro, no Programa Vocacional, realizada no equipamento da Prefeitura da Cidade de São Paulo CEU CASABLANCA (Capão Redondo - Zona Sul/SP) desde 2012 até a atual. É importante registrar este percurso, o tempo e a continuidade sempre discutidas no Programa, destrinchar disparadores de processos de emancipação oriundos da relação EU-OUTRO-MUNDO, potencializados e evidenciados a partir de experiências artísticas. Tal ação cultural de criação propõe fazer a ponte entre as pessoas e a obra de cultura ou, arte, para que, dessa obra, possam as pessoas retirar aquilo que lhes permitirá participar do universo cultural como um todo e aproximarem-se umas das outras por meio da invenção de objetivos comuns (COELHO, 1997).
Neste sentido, o termo experiência estética é tomado em seu sentido amplo: não se refere apenas à construção de uma obra, à sua elaboração física, mas também ao desenvolvimento das relações entre as pessoas e uma obra – e das pessoas entre si por intermédio da obra – que permitirão a apreensão mais larga possível do universo da obra e a ampliação dos universos pessoais (COELHO, 1997).  Desta forma, os termos experiência estética e processo serão apresentados, no sentido daquilo que é fundamentalmente observado no trabalho,  a partir das experiências de montagens, é o próprio processo que oportunizou tais “resultados”. Buscamos observar a intrínseca relação de pesquisa artística, e “confecção” de uma visão de mundo por parte dos participantes feitores da obra, que se estende à montagem do espetáculo que procura dividir e ou, desdobrar tal experiência de formação com o público.
A partir do campo de investigações do Construtivismo Semiótico-Cultural em Psicologia chegamos as questões da polifonia nas relações intersubjetivas e relacionais, do sujeito como multiplicidade e, o aspecto de impossibilidade de comunicação total ou integral entre indivíduos (BAKHTIN, 2010) - todos experimentados a partir das dissoluções possíveis do corpo como teia, do corpo próprio como possibilidade de leitura de subjetividade provenientes da fricção sujeito-mundo.
Pensamos que desta maneira, este olhar permite observar processos de desenvolvimento individual decorrentes desta fricção e interação proveniente da relação eu-outro proporcionados pelo ambiente cultural em que ações simbólicas possam ser observadas. Abrindo-se diferentes possibilidades de ser e estar em relação aos outros, e com as coisas do mundo, evidenciadas no processo criativo como potencializador, e forte elemento para a tomada de consciência dos participantes selecionados para a pesquisa, imbricados nesta malha do tecido social e cultural.
A experiência artística se estabelece como forma privilegiada de criação e acesso a subjetividade, a partir de experiências construídas individuais e coletivamente por seus interlocutores possibilitando uma compreensão diversa dos participantes no diálogo. Sendo a sociedade uma realidade ao mesmo tempo objetiva e subjetiva, qualquer adequada compreensão teórica relativa a ela deve abranger ambos estes aspectos (BERGER, LUCKMANN, 2003). O avanço que se coloca atualmente na psicologia cultural é o desenvolvimento intensamente internacional de novos tipos de abordagem, possibilitando uma nova ciência: interdisciplinar, desenvolvimental e social (VALSINER, 2012). Desta forma a experiência dinâmica do sujeito inserido em um mundo de múltiplas possibilidades vem a ser abarcada de maneira igualmente dinâmica e aberta a estas novas direções. O campo de estudos proposto pelo Construtivismo Semiótico-Cultural em psicologia - tendo como uma de suas características fundamentais o caráter interdisciplinar - contribui amplamente em novas abordagens procedimentais e metodológicas (GUIMARÃES, 2012) para a psicologia.


2. Contextualização Teórica
A esfera da contemporaneidade, da vida cotidiana é observada em sua intersecção com a interpretação que fazemos da realidade, filtrada pela narrativa, pela mediação da linguagem, pela percepção e expressão como aponta a fenomenologia sociológica de Berger e Luckmann (2003). Para isto, como exercício de transposição, procurei estabelecer um paralelo entre processo de construção da narrativa dos sujeitos, e ou, da vida cotidiana e a construção do ator e/ou, interpretação cênica com vistas a experiência do ser no mundo e autoconstrução. Conforme o objetivo geral da pesquisa, que procurou compreender os processos dos participantes das atividades do Programa Vocacional, daquilo que lhes permite perceber, interagir e ressignificar o universo cultural e afetivo ao qual estão em relação, aproximando-se uns dos outros por meio da invenção de objetivos comuns, proporcionados pela experiência estética e construção simbólica de sentidos.
Se é verdade que tendemos a assumir um “papel” frente a nossa realidade cotidiana, e efetuar tal re/construção de nós mesmos a partir dos relatos que construímos sobre nossas próprias histórias em um processo semelhante ao que fazem os atores, observar a maneira de criação dos discursos retirados da realidade e trabalhados no teatro, podem conduzir a uma perspectiva inspiradora para a compreensão do próprio ser no mundo, partindo de sua própria existência, afim de perceber reverberações implicadas no processo artístico.
A constituição dos sujeitos esta atrelada a maneira com a qual constróem sentidos sobre as ações interativas, formando sua consciência no processo de interiorização de discursos preexistentes, atualizados nas continuas e permanentes interlocuções de que vão participando. As relações intersubjetivas e dialógicas estariam sujeitas neste processo interativo a uma tendência de criarmos consenso porque tais relações aparecem como baliza de interação simbólica (SIMÃO, 2010). Conforme sugere Simão (2010), cada sujeito em interação transforma ativamente as mensagens comunicativas recebidas do outro, tentando integrá-las em sua base cognitivo-afetiva (SIMÃO, 2010). Partir do pressuposto que o ator pode ser um meio de experiência empírica para percebermos tanto, processo de simultânea ressignificação do discurso do outro, quanto a tendência humana de criar um campo de consenso nas interações foram um dos disparadores para a construção desta pesquisa.
Se partirmos do pressuposto que o texto é um outro, a priori uma alteridade agindo dialogicamente no corpo do ator; por via de dois processos dialógicos: heterodialógico (com outros, incluindo outros imaginários) e o autodiálogo (dentro do próprio self). Estes domínios intrapsicológico e interpsicológico (VALSINER, 2012), podem ser observados no fenômeno artístico e serem discutidos e observados dentro de um campo de construção partilhável, que pode ser explorada como material de estudo em Psicologia. A natureza irrepetível da criação artística pode ser observada sob esta a ótica da retroalimentação e transformações oriundas de nosso diálogo com os outros (texto) e conosco mesmos (criação). O ponto de vista escolhido para o trabalho do intérprete é que o ator “empresta” suas emoções ao personagem, o texto cênico também se origina das próprias ações do ator dentro das circunstâncias da cena, da dramaturgia, prevalecendo o critério geral da criação, o ‘se’, gerado a partir da pergunta o que eu faria em tais circunstâncias.

O self não está apenas “aqui”, mas também “lá”, e, devido ao poder da imaginação, a pessoa pode agir como se ele ou ela fosse o outro. Eu construo uma outra pessoa que eu posso ocupar e uma posição que cria uma perspectiva alternativa sobre o mundo e sobre mim mesmo. (HERMANS, KEMPEN, E VAN LOON, 1992, p. 25).

Compreendemos que o self dialógico na perspectiva proposta por Hermans, evidencia um inquietante espaço para a construção de novos saberes, que podem ser provocados pelo contato empírico do fazer artístico ao fenômeno de constituição do ser no mundo, no tocante às características de subjetividade de suas interações verbais, provenientes das noções de consenso-dissenso, e acomodação e diferenças dos discursos e suas formas de assimilação (SIMÃO, 2010). O diálogo aqui proposto com as artes pode contribuir com reflexões sobre o lugar da corporeidade e/ou, do corpo próprio como referencial simbólico para construção de identidades e alteridades.
O corpo articula experiências ligadas ao afeto e à memória na construção artística, a atividade mnemônica se dá na sua prolongação com o presente, dada na experiência atual (Hermans, Kempen, e van Loon, 1992). Em parte, a atividade mnemônica consiste em todos os conteúdos detalhadamente registrados, armazenados pelos sentidos e selecionados pelos afetos: a memória em sua acepção clássica, como persistência do vivido. Mas ela também é criação quando se coloca em atividade para responder as demandas do presente, oferecendo combinações de impressões como sínteses mais ou menos prováveis ou criativamente possíveis para a solução das questões (HERMANS, 1999), que também encontra paralelo na clássica figura do cone invertido, o cone Bergsoniano, em que a boca grande é o caldeirão das lembranças [imagens virtuais] que vai se estreitando, pressionado, rumo ao plano do presente, em que se apóia o vértice (BERGSON, 2006).
Tais experiências artísticas, passam a existir e ressignificar processos na vida cotidiana, com o enfoque artístico poderemos observar sua capacidade de comunicar significados que não são expressões diretas da subjetividade "aqui" (de meu corpo) e "agora" (do meu presente), quer dizer, da realidade da vida cotidiana. Mas, também obter a experiência de assuntos que não fazem parte do "agora", que não foram experimentados ou sequer vistos. A linguagem de uma forma geral tem a capacidade de guardar acumulações de significados e experiências, prevendo e transmitindo essas experiências às futuras gerações. Tal fato ocorre pela transcendência da linguagem que se destaca do presente, indo ao passado; ela pode "tornar presente uma grande variedade de objetos que estão espacial, temporal e socialmente ausentes do aqui e agora" (BERGER & LUCHMANN, 2003, p. 59).


3. Programa Vocacional - Ceu Casablanca (Capão Redondo Zona Sul - Sp)
A pesquisa foi feita a partir de uma leitura da Psicologia Cultural em sua vertente Semiótico-Construtivista do trabalho artístico desempenhado no projeto de ensino de artes do Programa Vocacional da Prefeitura Municipal da Cidade de São Paulo. Trata-se de um programa cultural que se apóia no diálogo entre teoria e prática, no qual conceitos ligam-se constante e circunstancialmente a realidades em transformação. Para tanto, propõe a instauração de processos criativos coletivos baseados na tríade fundamental das artes cênicas: elementos da cena, tessitura cênica e recepção da obra.
O Programa Vocacional é composto pelos Projetos ARTES INTEGRADAS, MÚSICA, TEATRO, DANÇA, LITERATURA, VOCACIONAL APRESENTA E ALDEIAS, e acolhe pessoas com idade igual ou, superior a 14 anos, com a finalidade de promover a ação e a reflexão sobre a prática artística, a cidadania e a ocupação dos espaços públicos da cidade de São Paulo. Com uma equipe de coordenadores e artistas orientadores, atua preferencialmente em equipamentos da Secretaria Municipal de Cultura e da Secretaria Municipal de Educação em zonas periféricas da Cidade de São Paulo.
O Programa Vocacional não visa o desenvolvimento técnico e a detecção de talentos, mas pretende a emancipação por meio do trabalho artístico-pedagógico, o que se dá não como um atributo individual, mas como o conhecimento adquirido por meio de uma prática coletiva.    Nesse contexto, emancipação é produção de processos de subjetivação. Considerando como subjetividade um conjunto de condições nas quais indivíduos e/ou coletivos estejam em posição de emergir como território existencial, capazes de estabelecer relações de alteridade, abrindo a possibilidade de serem sujeitos de seus próprios atos e processos. A palavra vocação, do verbo vocare é aqui entendida como dar voz aos seus participantes por meio da expressão artística, pretende-se que todos busquem uma participação ativa e consciente em suas práticas, conceitos, procedimentos e escolhas relacionadas ao discurso poético produzido individual e coletivamente.
A pesquisa foi realizada com os registros de atividades realizadas com uma turma de iniciantes e dois grupos amadores de teatro no equipamento da prefeitura municipal de São Paulo, CEU CASABLANCA[1], um complexo educacional, esportivo e cultural de caráter público.


4. Da Caracterização dos participantes, periodicidade de encontros e Procedimentos para a elaboração do material:        
O material analisado consistiu na leitura dos protocolos confeccionados ao longo dos encontros, como registro do processo. A faixa etária dos participantes neste atual momento da escrita do texto é entre 16 anos e 30 anos. As atividades do Programa Vocacional acontecem uma vez por semana, o encontro tem 3h. de duração, normalmente aos domingos. A atividade do Programa Vocacional, compreende 8 meses por ano, com encontros semanais de 3h cada, atuando necessariamente em equipamentos da Prefeitura da Cidade de São Paulo em zonas periféricas, o oferecimento das atividades é livre para interessados a partir de 14 anos e gratuito.
Com a presente pesquisa procurei compreender como a produção artística ressoa e ressignifica a vida cotidiana dos participantes, interpretando esses dados a partir de um diálogo entre concepções oriundas do Construtivismo Semiótico-Cultural em Psicologia e as Artes Cênicas. A análise dos protocolos produzidos pelos próprios participantes, relacionada as experiência artísticas disparadoras, proporcionaram um rico material de  análises dialógicas, permitindo observar a natureza intrínseca e polissêmica do fenômeno, as possíveis articulações com eixos de interesse que orientam a transformação do material em dados (VALSINER, 2006).
Por intermédio da análise e exposição dos “Protocolos” (registros do processo), escritos pelos participantes ao longo dos encontros, que aprofundaremos no próximo capitulo. A expectativa é que se aponte por meio desta análise, uma possibilidade de visualizar os pontos em que obra e vida tornam-se um mesmo ato criativo, com o olhar e percepção em relação ao que já está ali, ao que já existe no mundo, que interfere na leitura que fazemos do mundo, descortinando novas possibilidades e recriações de uma realidade fragmentada e multifacetada que se constrói e reconstrói a medida que a significo.


5. A Dinâmica dos Encontros
Em linhas gerais, a proposta metodológica para a atividade teatral da qual se fala aqui costumava ser emoldurada pela seguinte “rotina” ou “ritual”: (1) Limpeza e preparação do espaço. (2) Círculo inicial de discussão – quando o protocolo da sessão anterior era apresentado e assim definiasse o participante que se responsabilizava pela redação do protocolo daquela sessão, neste momento incial eram colocados questionamentos referentes aos encaminhamentos do processo, leituras de materias de referências também eram comuns neste momento do encontro, tais como: Filosofia, Literatura, Poesia, etc.; (3) Proposição e delimitação da área de trabalho; (4) Divisão de grupos/equipes, execução dos jogos/exercícios/ experiências artísticas, dados a especificidade do encontro; (5) As propostas para a atividade teatral foram emolduradas pelos sistemas e inspiradas em Peter Brook, Yoshi Oida e método do Ator de Antunes Filho. (6) Avaliação e apreciação coletiva, simultâneas as experiências cênicas (exercícios), e ou, apresentação de cenas, monólogos e montagens;  (7) Circulo de discussão para o encerramento dos trabalhos do dia. Os encontros se davam em duas vezes por semana, cada encontro tinha 3h. de duração, no entanto, era bastante comum as atividades se estenderem para além das 3h. iniciais.


6. Possibilidades de um gênero discursivo -  Sobre o Protocolo
A escrita ou, registro dos encontros por intermédio do Protocolo, foi adotada durante todo o processo artístico-pedagógico. Nos permitindo um instrumento de avaliação do processo vivido utilizado na metodologia de ensino-aprendizagem, compreendido como um conjunto coerente de signos (BAKHTIN, 2010), produzido a partir da experiência vivida no encontro anterior, por um dos participantes do grupo. O protocolo é a possibilidade da partilha de uma perspectiva singular do encontro anterior, feita por um dos participantes e lida no inicio do encontro seguinte. Ou seja, esta metodologia se vale de dois momentos distintos: o primeiro individual onde é feita a escrita do texto e, o segundo momento quando este é compartilhado com o grupo e discutido. A característica deste relato esta ligada a uma experiência prática, pois sua escrita vincula-se a experiência sensório-corporal pertinente a prática artística do fazer teatral. Pode relacionar-se mas, não se limita a uma contextualização teórica apenas, é um jogo de imbricamentos da experiência e construção de sentidos que aparecem nas reflexões.
O texto do protocolo é primordialmente escrito, mas pode referir-se através de outras linguagens como: cenas, vídeo, música, fotografia, dança, desenho, canto, jogo, enfim é a manifestação de uma ideia provocada pelo evento do encontro ocorrido com o grupo do fazer teatral numa determinada data.
Em nosso caso nos valemos sobretudo, do protocolo escrito que poderia ser também acompanhado de outras formas de significação da experiência.  O protocolo como texto escrito, pode ser compreendido pelo pensar de BAKHTIN (1999) como um ato de fala impresso é, portanto, um elemento da comunicação verbal. É ainda, objeto de discussões ativas sob a forma de diálogo e, além disso, é feito para ser apreendido de maneira ativa, para ser comentado e criticado. É orientado em função de intervenções anteriores na mesma esfera artística do teatro, tanto as do próprio autor como as de outros autores participantes do grupo.
O discurso escrito é parte integrante de uma discussão, ele responde a alguma coisa, refuta, confirma, antecipa as respostas e objeções potenciais, procura apoio, motiva a criação no processo vivido. Segundo Koudela (2001), o protocolo aponta para o futuro, funciona como uma mola propulsora no movimento da criação artística teatral.


7. Considerações finais
Diante de constatações, pesquisar o campo dos afetos implica evitar tentativas ingênuas de acesso direto ao fenômeno, por meio de abordagens lineares de pesquisa. Implica, portanto, explorar novos caminhos, quiçá inspirados pela arte, que permitam um aprofundamento qualitativo sobre a inesgotável complexidade humana. (WORTMEYER, D. & SILVA, D. & BRANCO, A., 2014, p. 42).

De fato, a história da psicologia como disciplina cientifica revela-nos múltiplas tendências e uma imensa variedade de trajetórias-metodológicas no sentido de promover a produção do conhecimento (BRANCO & ROCHA, 1998), e deste modo, o contato com a atividade artística nos convida a proposição de novas formas de abordagens teórico-metodológicas em Artes Cênicas, onde podemos perceber fundamentalmente a importância do cotidiano, do debruçar-se a experiência, e as oportunidades que o trabalho da experiência artística podem proporcionar. No sentido, de ir transformando o sujeito, criando uma série de dispositivos para uma leitura mais complexa de si mesmo e do mundo. Transformando este em um outro. Ou, possibilitando perceber os outros que lhe compõe.
Sob a perspectiva que procuramos abordar, a experiência motora do corpo, antes de ser do campo de conhecimento, é comunicação com o mundo, da presença de um mundo, do modo como as coisas constituem-se para nós. Depreende-se como característica principal do desenvolvimento a noção de processo, de dinâmica e transformação de um sistema aberto (organismo) em continua interação com o contexto em que se insere (BRANCO & ROCHA, 1998).
Selecionamos alguns trechos produzidos em protocolos de maneira espontânea, ao longo dos encontros. Tratam-se devemos lembrar de artistas jovens (participantes da pesquisa) que descortinam esta existência a partir da experiência estética. Fazendo uma entrevista com alguém que lhe interessasse e posteriormente o material transformado em um texto, um monólogo. A idéia não era propor uma grande dramaturgia, ou que se criasse uma expectativa com as respostas, mas, fundamentalmente propor uma experiência de Escuta, no mais dos dias, hoje cada vez mais atravessados pela falta de tempo. Nesse tempo em que ninguém tem tempo para ter tempo, a delicadeza de uma vida parece ter sido relegada à ficção. No trabalho artístico podemos ouvir nos interstícios desta loucura aquilo que chamamos Vida. É o próprio artista ocupado em sua ficção que nos relembra e convida ao sentir, natural que ao nos depararmos com tais trabalhos literários, plásticos, nos enternecemos ao testemunhar sutilezas que esquecemos de enxergar, ou, não somos capazes de enxergar nos nossos dias de autômatos.
Os sujeitos se constituem como tais nas ações interativas, formando sua consciência no processo de interiorização de discursos preexistentes, atualizados nas continuas e permanentes interlocuções de que vão participando. A história vivida é o resultado de um projeto que é fornecido pela coexistência com os outros (MERLEAU-PONTY, 1999). Realizar esta nova condição de Escuta do outro e de si mesmo, é fruto de um processo, não só reflexivo, mas experiencial, que se oportuniza a partir da fricção entre “corpo existencial” e “corpo estético”, ou seja, “vida real” e “vida criativa”, e a partir desta fricção novas camadas vão sendo geradas, percebidas e acessadas, permitindo uma tomada de percepção cada vez mais complexa do fenômeno da vida e suas possibilidades de experiência.
Nos coloca em um estado de atenção que nos obriga a construir sentido com aquilo que temos de conhecimentos prévios, muitas vezes este contato silencioso torna-se uma conversa com múltiplos sentidos e associações que podem ir agindo nesta relação eu-outro, transformando mutuamente os sujeitos em contato. Os diferentes “Eu’s” que habitam um mesmo sujeito, divergem entre si e nesta relação vão constituindo a cada momento novas perspectivas de olhares.

Paramos diante do estranho para ouvi-lo. Reconhecemos o que nos chega, não necessariamente como nosso, mas que poderia ser. Essa incerteza quanto a nossa presença no mundo permite que nos aproximemos de tal modo da vida do outro que já não possamos friamente separá-la da nossa.
Ao ficarmos diante da história de um ser humano, consentimos antes de tudo para que a vida se faça; olhamos em seus olhos e deixamos que as memórias, imagens passem ‘entre vistas’. É um momento de apoteose, desses de que a vida é feita e para os quais é preciso que existamos.
Talvez passemos cada um de nós nossas vidas em nossos caminhos individuais, buscando entender o todo ou mesmo já desesperançados de achar respostas, quando, como num encontro de notas alta e baixa, criamos um movimento harmônico: notas tão distintas e distantes se encontram e percebem estarem dentro de uma malha maior, um pano não-plano em que as regras aprendidas em vida não necessariamente funcionam ou são precisas, pois sentimos que somos parte de uma obra grandiosa em que nossos corpos tão simples propagam ondas sonoras, cada uma em seu tom, umas de tão mínima frequência, pianinhos, outras quase estrondos, metais pesados – tudo para que se forme o grande coro consonante, de movimentos ora uníssonos ora dissonantes, que seguem-se numa ordem própria e nos levam sempre adiante, a um espaço e tempo desconhecidos que, para que se mantenha a ordem, não nos cabe saber. (Renier Vasconcelos, 16 anos – 29.09.2013, participante da pesquisa).

É importante observar nos dois textos a separação e amadurecimento dada pela experiência dilatada no Tempo. Certamente outra noção que nos inquietava resultante a experiência estética, é como podemos percebe-la ampliando condições de leitura, escuta e compreensão do mundo? Parte do objetivo era trazer à luz o campo da criação artística como analogia da construção sensível do ser humano, e por conseguinte, a constituição de sua visão de mundo. O trabalho aprofundado de leitura do texto com vistas a destrinchar camadas mais densas de seus significados, gera uma via de mão dupla, ao investigar as palavras do outro a partir do colocar-se na situação e emprestar suas emoções para dar vida as palavras ditas por outrem, o artista reflete sobre suas próprias emoções e abre espaço para novas dinâmicas afetivas, oportunizadas pelos universos e significados da experiência do outro.
Um ano depois amparado pela experiência no corpo de construção da “personagem” o mesmo participante reflete sobre seu processo:

Gostaria de compartilhar minha experiência com o meu texto, com a minha personagem; uma experiência da criação/entendimento da  pessoa/personagem. É certo que para entendermos um indivíduo da maneira mais próxima do que chamemos verdadeira, é preciso nos confundirmos com ele, num momento de experiência. Por isso, acredito que não havia ainda tido este entendimento, mesmo que não total, da minha entrevistada desde que houve o encontro. De uma certa forma, entendi a situação intelectualmente, sabia que se tratava de uma existência muito delicada. Mas a oportunidade, ou disponibilidade de aproximar-me dela não houve, e por vezes deixei que se confundisse a mulher que um pouco conheci com o que se esperava que ela, imersa na superficialidade, fosse.
Mas eis que houve a ocasião. E em reconhecimento, cada palavra de seu discurso saía-me tirando dor. Em poucos segundos, em meio a uma rua movimentada, uma obra em construção, o monumento dos Correios, São Paulo, seus olhos já molhados. A emoção só esperava que fosse chamada, e então se mostra nas palavras-desculpas: “é normal, é normal”; há de ser, pois se não for... – se não fosse; é normal. Uma mulher, e seus filhos.
Agora, dou expressão ao seu grito surdo de denúncia e socorro.
Simbolicamente, a salvo. A salva, a Arte. (Renier Vasconcelos[2], 17 anos – 20.07.2014, participante da pesquisa).

Com a observação mais atenta deste processo de elaboração de sentidos por parte do participante, se mostra imprescindível as considerações fenomenológicas implicadas em experiência do ser imanente através do corpo e do estar das coisas no mundo (MERLEAU-PONTY, 1984), e o corpo-criação-movimento (OITICICA, 2011). Propõe um processo dinâmico, criação de sentidos pelo ato corporal, traz consigo a transformação do próprio espaço, e a maneira que as experiências constróem e ressignificam experiências,  que consideram as contribuições de uma experiência conjunta de construção de identidades e alteridades. Para se aproximar por outras vias de ver as coisas como o outro as vê, deve-se desenvolver um pensamento heterológico, ou seja, interromper a percepção de mim mesmo e ver as coisas do ponto de vista do outro (o “SE” stanislaviskiano) e dos outros que residem e pedem passagem em mim.
Quando a palavra é escassa na dramaturgia, as imagens expõem aos espectadores os conteúdos mais profundos, o silêncio passa a ter condições objetivas de se comunicar, a relação artística proporciona o campo da visualidade, os silêncios outrora incomunicáveis e até desconhecidos, tornam-se expressão artística da pessoa que o elabora. A poesia é palavra poética, é campo relacional, é a possibilidade de transpor o campo da significação imediata, do sentido absoluto. As cores tornam-se outras em relação à obra de cada artista, todos estão hierarquizados por suas inéditas existências e pelas ressonâncias que alcançam na intersubjetividade.
A experiência artística de introjetar um texto, e relacionar-se com este de maneiras outras, na atividade de criação do ator, nos possibilitou perceber a colaboração da fala aliada a experiência prática de contato com a obra de arte (VYGOTSKY, 2007). Percebemos ao longo dos encontros que uma via para está forma de conhecimento, é a possibilidade efetiva e atuante que se faz de dentro e com a práxis da vivência intencional (MERLEAU-PONTY, 1984), ter ciência desta possibilidade de intervenção no mundo pode proporcionar àqueles que participam do fenômeno artístico novos mundos possíveis.
Algo primordial é a relação entre o que nos é conhecido e o “estrangeiro”, a relação entre conhecimento e ignorância, certeza e incerteza. Processos de destradicionalizar e individualizar vidas, diferenciação e globalização, fazem com que muito de nossa vida diária, que por um lado se pressupõe, seja colocado em dúvida, pedindo mais reflexão e decisão individual (WULF, 2013).
Uma possibilidade para se ter uma atitude aberta para o Outro talvez seja estar consciente de si mesmo, enquanto Ser em constante transformação, reformulação e ressignificação. O confronto com outras possibilidades, com o outro em nossa própria cultura e com o estrangeiro em nossa própria pessoa, nos ensina a perceber e a pensar do ponto de vista dos outros. A mudança de perspectiva evitaria que reduzíssemos sem pensar o “estrangeiro” ao que nos é próprio (SIMÃO, 2010). Desta forma, poderíamos em sugestão poética dizer que os processos artísticos gestam em si mesmos as “dores do parto”. Do perceber o outro em seu próprio organismo, “estar gravido do papel”. Nesta perspectiva o que seria um jovem defrontar-se com um outro que torna-se estrangeiro dentro de seu próprio corpo?:

A vida é feita de fantasia. O objetivo da arte talvez seja juntar toda essa fantasia, e torná-la realidade. Todos os dias passam por mim, mas alguns me deixam com hematomas. Manchas azuis que doem por dias e quando curam, são lembranças. Eles me marcam, se tornam vida, e após a mim se tornam minhas memórias. Eu não sou um homem, sou experiências, me torno o que sou e sou o que fui e o que não serei. Sou saudade. Sou um homem que sofreu a perda de todas as possibilidades, sou quem perdeu os sonhos, que teme a realidade. Quando me dilato sou um só, mas encubro todos, sinto a dor de todos, sou Renata. Meu corpo corrompia minha alma, mas em uma revanche de vergonha, minha alma corrompeu meu corpo. E eu voei, fui para mim o que nunca fui para ninguém, fui para meu encontro e ao me ver, chorei. Dentro de mim há todos os sentimentos, como há dentro de você pedaços de mim e dentro de mim, você. Ouço seu choro, sinto sua dor, não te sinto, mas estou contigo em todos seus momentos de luta. Não sei como é estar preso dentro de si mesmo, mas ouço seus pensamentos, sinto o cheiro das suas mágoas. Esta água salgada que queima minha pele é saudade. Minhas moléculas se chocavam e se afastavam. Eu te sinto vibrar e transbordar palavras, estas que escorriam pelo meu rosto, que mancharam minha pele, essas que você nunca me disse e talvez nunca tenha dito a alguém, mas sei que você são elas e elas são você em sua maior plenitude, mesmo que nunca ditas estavam explodindo por seus olhos  e queimarão todos os que te olharem como é, uma mulher. (Elvis Torres,[3] 18 anos – 14.09.2014, participante da pesquisa).

As proposições oriundas de Vygotsky, sugerem que a personalidade, ou, a visão de mundo se constitui nesta fricção de reposicionamentos do ser diante dos conflitos que caracterizam o drama da existência, os quais resultam em uma configuração dinâmica e singular. Dentro de mim há todos os sentimentos, como há dentro de você pedaços de mim e dentro de mim, você. Ouço seu choro, sinto sua dor, não te sinto, mas estou contigo em todos seus momentos de luta O que podemos perceber é que na atividade artística, nos modos a que esta foi trabalhada ao longo da pesquisa, esta elaboração de sentidos compreende, o afeto, os sentimentos e as emoções como constitutivos da personalidade e das funções psicológicas superiores (VYGOSTSKY, 1990).
O trabalho teatral, abordado nesta pesquisa evidenciou possibilidades, conforme aponta (VYGOTSKY, 1990) que o corpo pode ser agente de retroalimentação no campo da ativação estética, o corpo que atua pode ir além das macro-percepções e se deixar levar pelas forças do inconsciente. Ao experimentar-se em novas práticas, transduzindo a experiência poética da obra em si mesmo, o artista produz desvios e rupturas a modos anteriores e provoca outras resoluções, no alargamento de seus movimentos, gerando os chamados reposicionamentos do ser diante dos conflitos, os afetos são parte inextricável do criador-criatura que já não mais necessita dividir realidade e ficção e apenas experiência neste novo-corpo-ação uma possibilidade outra de (re)exisitir.
Nesse sentido, uma certa noção de identidade é atravessada pela experiência do outro que não é meu limite externo, mas a experiência através da qual eu posso me totalizar. Assim, se a experiência do corpo consigo mesmo, é um visível capaz de reflexão, propaga-se na relação entre ele e as coisas, por extensão, expande-se na relação entre ele e outro corpo. Nesse contexto, interior–exterior, corpo-obra, artista-espectador, mesmo-outro, são dualidades que o pensamento dialógico aqui proposto, procuraram considerar para pensar o enigma do envolvimento recíproco do que vê e do que é visto, da impossível coincidência consigo mesmo do vidente e do visível, do advento do mesmo à prova do outro. 
Em caminhos im/permanentes. Em caminhos de Mistérios.


REFERÊNCIAS
BAKHTIN, M. (1999) Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. São Paulo: Hucitec.
___________ (2010) Estética da Criação Verbal. (trad. Paulo Bezerra) São Paulo: Martins Fontes.
BERGER, P; LUCKMANN, T. (2003) A Construção Social da Realidade. Petrópolis: Vozes.
BERGSON, H. (2006) Memória e Vida. São Paulo: Martins Fontes.
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Hercules Morais
Ator, professor e pesquisador Multidisciplinar. Licenciado em Filosofia e Artes Cênicas. Membro fundador do Núcleo de Artes Cênicas (NAC), que tem como foco a pesquisa do trabalho do ator no teatro contemporâneo. Em diálogos interdisciplinares investiga a relação entre Artes Cênicas e Psicologia Cultural Dialógica, afim de evidenciar disparadores significativos de processos criativos. É bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Brasil.




[1] Centro Educacional Unificado CASABLANCA, localizado no Jd. São Luiz (Capão Redondo - Zona Sul/SP)
[2] Renier Vasconcelos construiu seu texto-monólogo em entrevista realizada com uma garota de programa.
[3] Elvis Torres, construiu seu texto-monólogo em entrevista realizada com uma transexual.

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