Procedimento, Processo, Produto!
Artista orientador Ernandes Alves de Araújo
Linguagem: Teatro
Equipe: Centro Oeste
“Um
trampolim! Para novos saltos! Ou quem sabe” como abrir portas para
que um anjo passe em nossas vidas” ! ( Anatoli Vassiliev)
Saltar
desse trampolim altíssimo : O desconhecido. Ir em busca de um
procedimento que possibilite abertura para experimentação de outras
premissas para pensar a cena, ou permanecer na razoável zona de
conforto, seguindo a cartilha dos jogos teatrais? Dentro dessa
perspectiva me propus neste 2014, a repensar meu repertório, a
tatear, tentar, inventar e principalmente instigar os artistas
vocacionados a experimentar um caminho menos previsível do jogo
teatral.
Para
isso, foi necessário, abandonar esse lugar perigoso da reprodução
do real, da cópia dos clichês televisivos, para buscar o risco, o
perigo, o desafio, lançar-se pelo espaço, sem a necessidade de
construir enredos, apenas uma escrita poética com seu corpo. A
aventura desse primeiro momento, foi potencializar corpos endurecidos
pelo cotidiano, buscar um corpo flexível, poroso , receptivo, por
sensações e ressignificações de si e do outro.
Como
instaurar processos em turmas com vocacionados flutuantes?
Vocacionados instantâneos, que surgem e desaparecem na mesma
velocidade da luz! Uma questão delicada, que fragiliza a ideia de
processos contínuos, que ao final resultam em um produto. Essa
palavra ascende a luz nos olhos deles, que querem o produto teatral,
a peça, se possível sem a necessidade de processos criativos,
longos e difíceis, ou seja sem o meio, só inícios e fins.
Dentro
dessa instantaneidade real e inerente do projeto, escolhi investigar
procedimentos que verticalizassem a pesquisa corporal, sonora,
espacial, e cada procedimento em si, era também uma pesquisa
estética, constituía uma linguagem, possuía uma formalização em
sua construção, que segue um lógica simples, criar
individualmente, selecionar, e mostrar o material pesquisado.
Esse
percurso criativo permitiu ao final de cada procedimento, um
resultado estético a ser apreciado por todos que experienciaram e
juntos construíram pequenos instantes teatrais, assim a palavra
processo está contida nessa pesquisa desse dia, está embutida na
capacidade de construção, e de elaboração de novos sentidos e
significados que cada procedimento imprime no corpo de cada um, e na
possibilidade de fruição de todos que são ao mesmo tempo
espectá-atores.
Possibilidades
: Composição poética do corpo
Entre
as diversas técnicas corporais
que estão a serviço de uma linguagem específica, abordagem
escolhida estava
alinhada aos estudos de Comunicação e Semiótica, cunhada pela
professora Helena Katz, “como Corpomídia", um corpo que não é
apenas recipiente das informações”,¹
ao contrário, ele processa e devolve ao mundo o conhecimento gerado,
numa troca constante e simultânea com a realidade, um corpo que é
sujeito de sua história, ativo e atuante no meio social em que está
inserido.
Este
pensamento permitiu,
que os Artistas-Vocacionados
desenvolvessem
uma percepção maior de
seus corpos, de sua individualidade, de sua identidade cultural,
estabelecendo conexões espaciais e sociais. Gerando
um corpo expressivo que comunica a sua singularidade e a
sua poética.
O
ponto de partida inicial foi buscar
impulsos e estímulos que permitisse o
corpo a sair dos seus
automatismos, que abrisse a
cortina para o novo, uma nova forma de
dizer e expressar os paradoxos do ser. Desafio para ressignificar
sentimentos, palavras, desejos com o corpo, potencializar o corpo
como expressão máxima do verbo, a palavra nesse momento foi
suspensa dos procedimentos.
Como
forma e conteúdo estão atrelados na criação artística, os corpos
em movimentos foram construindo imagens, pequenos instantes
dramáticos. Por exemplo: Um dos exercícios usados no aquecimento,
foi escrever o nome usando o próprio corpo no espaço. Esse simples
enunciado do exercício liberava os vocacionados a se lançarem no
espaço livremente, aos poucos outras camadas eram lançadas aumentando a complexidade do mesmo.
A
questão do tempo/ritmo, lento, normal, rápido, pausado, ou então
escrever com sensações de frio, calor, sede, fome, medo, raiva,
triste, apaixonado, abandonado, flutuando, enfim todas as gamas de
sensações foram explorados, e todas eram vivenciadas de maneira
única, particular, onde as singularidades dos corpos eram
evidenciados e toda descoberta era saudada como uma dança pessoal e
intransferível.
Outras
experimentações foram realizadas : corpos que atravessavam o
espaço/cenário : O deserto, a chuva, o dilúvio, a lama, o amor, a
solidão, a alegria, a paixão, e toda sorte de combinações foram
vivenciados, e aos poucos, esses corpos foram se apoderando do seu
poder de comunicação, e foram surgindo coros que eram alegorias: O
medo, a velhice, a solidão, o perigo. Essa composição resultou em
uma movimentação cênica para Instalação poética : CHAMA.
Corpo
e sua composição no Espaço
Outra
instância do trabalho se deu na exploração do corpo e a sua
relação no Espaço, um corpo que soma, que imprime significados
quando se relaciona nesse ambiente. Aumentar a sua consciência dos
signos e significados que o corpo possibilita no espaço teatral.
Potencializar
a sua capacidade de compor imagens e relações com o espaço e os
outros corpos. Estes procedimentos permitiram o lúdico como
componente fundamental para criação, de figuras urbanas no contexto
da cidade, da metrópole, que se configurou
o tema escolhido para pesquisa cênica.
Tema:
Cidade e suas Figuras Urbanas
Com
essa gama de material levantados, o cotidiano era o meio e não o fim,
para entender o os mecanismos que estavam por trás disto, ou deste
grande tema que foi o mote para pesquisa teatral: A cidade e as
suas figuras urbanas.
Assim, conceitos
como veracidade, unidade, linearidade, cópia ou imitação do real,
se distanciaram naturalmente, dando espaço para o inusitado, o
desconhecido a ser jogado, vivido como tema do ensaio, a busca não
era levantar cenas para o espetáculo, e sim estetizar os instantes
teatrais que foram formulados a partir dos procedimentos, que em si
continham uma expressividade cênica. Portanto, não haveriam a
necessidade de construção de enredos que justificassem a sua
existência, pois em si mesmo, eles continham uma célula
dramatúrgica, uma organicidade, que sinalizava a sua potencialidade
criativa.
.
Corpos+
Espaço+ Objetos =Instalação Cênica
Outro componente importante que abriu portas para criação desses instantes cênicos, foi a entrada de objetos e a relação ou estranhamento que poderiam causar com a sua presença, e também a sua ressignificação, ampliaram as possibilidades do jogo, onde guarda-chuvas se tornaram paraquedas, ou pedras opressoras, espadas ou revólveres, bichos de estimação viraram filhos, monstros, caixas viraram obstáculos a serem transpostos. Eles, os objetos se tornaram suportes fundamentais para a formalização de uma ideia, de uma imagem, permitindo a constituição de uma linguagem que se desvelava.
Esse
campo da linguagem, que foi surgindo dentro do processo, mas ainda
não havia elementos suficientes para entendê -la, porque ela não
foi um norte perseguido ou buscado durante a pesquisa, A linguagem
nasceu dessa experiência diária da prática dos procedimentos, que
viraram pilares do processo, que ao final resultaram em um produto
estético, a ser apreciado em si mesmo, e não apenas como material
para construção de cenas ou personagens.
Porque
os procedimentos foram ferramentas valiosas para improvisações da
imaginação, de "corporalidades", de construção de uma ficção não
linear, fragmentada, da constituição de uma linguagem , e do
surgimento do ator compositor, ou melhor de um artista vocacionado,
autor de sua escritura cênica.
Este
processo mobilizou o meu pensamento criativo e a minha abordagem
teatral com as turmas, rompendo no meu fazer essa dicotomia entre
pedagogia e prática teatral, me obrigou a me distanciar das fórmulas
fáceis e previsíveis, despertando em mim e principalmente neles, o
desejo de experimentar! Criando metáforas para quem sabe um anjo
passe.
“A arte não está nem no artista, nem na obra, nem no espectador, mas na experiência, ou seja, no que acontece “entre” a obra e o espectador ou “entre” o espectador e a obra. Tudo acontece nesse entre” Jorge Larrosa Bondía
Ernandes Alves de Araújo-
novembro 2014.
Bibliografia
Camargo,
Carlos Avelino de Arruda. Do lugar de onde se Vê, Aproximações
entre as artes plásticas e o teatro. Editora Unesp.
Greiner
Cristine. “ O Corpo, Pistas para estudos indisciplinares, Editora
Annablume, 2005.
Goethe,Joahann
WolfGang Von. Os anos de Aprendizados de Wilhelm Meister. Editora 34
Ferracini,
Renato. A Arte de Não Interpretar como poesia corpórea do Ator.
Editora Unicamp.
Larrosa
, Jorge. “Notas sobre a experiência e o saber de
experiência”
Ponty,
Maurice Merleau. O Olho e o espírito. seguindo a linguagem indireta
e as vozes do silêncio. Editora Cosac &Naif.
0 Comentários:
Postar um comentário
Assinar Postar comentários [Atom]
<< Página inicial