formação. S. f. 1. Ato, efeito ou modo de formar. Ensaio I Roberta da Silva Santos (Roberta Viana)
Vocacional Artes Integradas
Roberta da Silva Santos (Roberta Viana)
Roberta da Silva Santos (Roberta Viana)
Centro de Formação Cultural Cidade Tiradentes
Inicio este ensaio com o relato de uma apresentação do
Coral Paulistano Mário de Andrade, com participação de Fabiana Cozza, no dia 26
de julho de 2014, no Centro de Formação Cultural Cidade Tiradentes:
Assim como em outros
eventos realizados no espaço, a fila para entrar no teatro é longa. Desta vez,
uma mostra inaugurando um novo curso, o de canto coral, estilo musical
diferente do que a grande parte da população do entorno está habituada. O
alvoroço, a falação, o burburinho é constante. Apesar da organização da fila,
quando se abrem as portas, ela não tão respeitada assim. Lá dentro, todas as
cadeiras são ocupadas e aos que já estão ao redor, lhes resta ficarem em pé. O
volume das vozes e cadeiras sendo arrastadas só aumenta; quase todos falam
muito alto e gritam. Apesar da grande quantidade
de público, não para de chegar gente, todos que aparecem conseguem entrar. São visíveis
pessoas em silêncio se sentindo incomodadas com o barulho. Umas, aparentemente,
moradoras do bairro e outras de fora. Por vezes, algumas pedem silêncio,
tentando organizar o ambiente, mas é em vão. Mulheres com crianças de colo
continuam de pé até que um funcionário do Centro Cultural solicita a gentileza
de cessão do lugar a elas, ele é atendido prontamente. Ao contrário, quando
pede silêncio para a apresentação da regente o do pianista, as pessoas não se
calam. Os responsáveis pelo coral aparentam estar
assustados com tal comportamento do público, mesmo assim, falam algo que poucos
escutam e enfim, a música começa. Primeiro, é realizada uma sensibilização
musical com “Aquarela do Brasil”, de Ary Barroso, letra impressa e distribuída
para todos juntamente com o programa do trabalho. A proposta é que o público,
acompanhando a letra, se integre ao piano e cante, apesar da luz da plateia
baixa, dificultando a leitura. Começa a apresentação do coral. O barulho, vozes,
xingamentos, assovios continuam em paralelo à música cantada lindamente.
Alguns,
talvez por falta de interesse, saem da sala logo no início, porém quando se
ouve a palavra “macumba” em uma das músicas, há uma debandada de quase metade
do público. Impressiona como a presença de tambores e as palavras do repertório
afro-brasileiro os atingem. Muitos abandonam a apresentação influenciados pela
opinião de outros. Por outro lado, o silêncio começa a surgir e os que ficam
aparentam interesse, o que contribui para a absorção e desenvolvimento do que
estava sendo mostrado. A comunicação artística começa finalmente a se
estabelecer. Foi uma ótima apresentação.
No
mesmo dia, em que estava acontecendo o “Arraial Cultural” [sic], no espaço externo, após
o espetáculo, o chão estava repleto dos folhetos com a música de Ary Barroso.
Pensando
em outros exemplos, longe de tender qualquer opinião, reflito sobre qual
caminho tomar nas mesmas situações:
Devido ao mesmo
comportamento citado acima o produtor decidiu interromper a peça, exigir
silêncio e atenção, de maneira opressora, conquistada por aproximadamente cinco
minutos. Ao final, a diretora do grupo se retratou e pediu desculpas pelo ato.
Já
Diogo Granato com Sketchbook, em 08 de agosto, realiza uma formação de público
implícita e não intencional. Conseguiu trazer o público para perto de si, fazendo-o
embarcar em sua viagem.
O que fica evidente é a necessidade de um
trabalho de formação de público no CFCCT, para que efetivamente seja um espaço
de constituição e desenvolvimento de arte e cultura. Além do
processo artístico desenvolvido com os vocacionados, também surgiram
questionamentos como a ocupação do espaço pelas pessoas do entorno, como
envolver a comunidade, a necessidade de uma maciça divulgação das atividades
promovidas e, o principal, como promover uma formação de público eficaz.
Há
também uma contradição, pensando em quantidade: apesar do grande número de
pessoas nas apresentações realizadas no teatro é baixo o de participantes em
oficinas e, principalmente, nas linguagens do Vocacional.
E as perguntas não cessam:
- Como promover a formação de público?
- Será que, assim como já sugeriram alguns
funcionários, criar e exibir um vídeo institucional (como os que vimos nos
cinemas) antes dos espetáculos auxiliaria neste processo, visto que a grande
referência do público é a mídia televisiva?
- Será que existe, de fato, o interesse em
receber grande público para as atividades, considerando que isso acarreta em
trabalho e dedicação por parte dos funcionários e gestores que, trabalham com
cargas excessivas, dando conta do trabalho que seria para um número muito maior
de funcionários?
- Será que basta o equipamento ser implantado
num bairro carente, mesmo sem a inclusão da comunidade, sem o suporte
necessário para o entendimento e uma verdadeira formação?
- Como lidar, por meio da formação cultural,
com questões de discriminação racial e intolerância religiosa, no entorno onde
a maioria da população é negra e igrejas evangélicas se proliferam rapidamente?
- É notável, mesmo que pouco, o interesse de
muitos usuários do espaço em se alimentar culturalmente. E o respeito para com estes,
dando bom acolhimento e suporte? E aos artistas que dispõem de suas criações
para comunicar com este público?
- Como promover a valorização do espaço e das
atividades pela comunidade, fazendo-a se apropriar e cuidar dele? Como criar
esta parceria?
São muitas as questões que envolvem esferas maiores e menores. Questões
que perpassam pelo local em si, pela gestão, pelo social, pela política
pública, etc. São problemas pontuais. São problemas de contexto mais
globalizado.
Logo no início, observei nas orientações a
presença de muitos jovens na área externa do Centro Cultural e, mesmo que convidássemos
a participar das atividades, eram quase nulas as respostas positivas. Uma vez
ou outra, alguém vinha, curioso com o que via através das grandes janelas de
vidro, mas tinha sempre muito mais gente do lado de fora que do lado de dentro
(!). Isso serviu de dispositivo para buscar entender o porquê do fato de a
maioria daqueles e as pessoas da comunidade não entram no espaço e não
participam da programação. Então, desenvolvemos a proposta de entrevistas
direcionadas às famílias e amigos dos vocacionados. Primeiro, entrevistamos a
nós mesmos, ou seja, ao grupo de participantes naquele período. Era uma maneira
de buscar quais perguntas seriam necessárias para chegarmos a algum
entendimento. As respostas foram muitas: o não conhecimento do equipamento no
bairro; a falta de tempo para frequentar o espaço; a ideia de que arte é perda
de tempo; a postura opressora dos seguranças, dentre outras. O material foi
coletado em áudio, vídeo e escrita. Repassamos informalmente o conteúdo para os
funcionários da gestão, eu levei para as reuniões de equipe, mas o mais
significativo foi gerado com os vocacionados, ou seja, o reconhecimento dos
problemas que envolvem a estrutura de organização do CFCCT e importância de
agir em detrimento da gestão, quer dizer, dar sua contribuição em favor da
divulgação, por exemplo.
A intenção do processo neste período de abril
a novembro de 2014 com os jovens e adultos (e até crianças quiseram se juntar!)
foi provocar e possibilitar a abertura de horizontes e experimentação de
procedimentos na esfera da arte, para gerar autoconhecimento e pensamento
crítico em relação a si, ao outro, a sua comunidade, à sociedade em geral, e,
principalmente, reconhecer a importância e potência de sua expressão artística.
Muitos chegaram sem saber ao certo o que vinha
a ser a linguagem Artes Integradas (até mesmo os funcionários não entendiam o
que vinha a ser), outros tantos buscando um aprendizado convencional de
expressões artísticas. Muitos passaram, experimentaram e abandonaram.

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