domingo, 23 de novembro de 2014

Uma imagem vale por mil palavras?

PROGRAMA VOCACIONAL ARTES INTEGRADAS – 2014
CENTRO CULTURAL DA JUVENTUDE "RUTH CARDOSO"

Artista orientador: Valter de Sant’Anna Nunes
(Valter Nu)

Uma imagem vale por mil palavras?

O que de tudo não compreende (...) é que, ao se desenvolverem as tecnologias de comunicação em autêntica progressão geométrica, de melhoria em melhoria, a outra comunicação, aquela propriamente dita, a verdadeira, de mim para ti, de nós para eles, continue a ser essa confusão cruzada de becos sem saída, tão decepcionante com suas avenidas ilusórias, tão dissimulada no que expressa quanto no que dissimula.
 José Saramago

Por anos, a frase "uma imagem vale por mil palavras" foi aplicada pela indústria midiática como verdade absoluta, mas, nos dias atuais, inúmeros questionamentos a tornaram expressão de conteúdo duvidoso e de pouca credibilidade. A ideia desse programa performativo é propor a desconstrução  dessa frase e reterritorializá-la na segunda década do  séc. XXI, onde  grande  parte das pessoas tem acesso a tecnologias de manipulação de imagens como softwares, editores e filtros  - inclusive em simples celulares -, ferramentas que há pouco tempo eram acessíveis apenas para profissionais da área.
            Anteriormente, a manipulação de imagens era muito mais difícil e complexa, o avesso do que podemos ver hoje, quando é possível em menos de 5 minutos fotografar, editar e postar uma  imagem com mensagens de qualquer natureza em uma rede social. Essa postagem, por sua vez, poderá ser instantaneamente replicada, com ou sem créditos do autor, e também com outras mensagens que não sejam as originais, possibilitando várias  interpretações  em diferentes partes do planeta. 
No período denominado pelo sociólogo polonês Zygmunt Bauman como modernidade liquida, a maior parte dos indivíduos tem em suas mãos celulares com máquinas fotográficas a partir dos quais criam uma imagem virtual,
 (...) porém seu tamanho e conteúdo são construídos de acordo com as preferências e predileções do proprietário individual, são fáceis de “limpar”, bastando para isto pressionar o botão de deletar, apagando assim as partes que não correspondem mais aos interesses ou perspectivas do dono (Bauman, 2011, p.46)

            Então, a questão que aparece é quais mil palavras serão escolhidas e adicionadas a quem ou ao o quê? Qual interpretação terá esta  imagem? A fonte da imagem será uma só? Ou as manipulações, edições e replicações com novos caracteres serão considerados? Quem decidirá a significação das mil palavras: emissor ou observador?  
 A indústria da comunicação foi uma  potente vendedora de verdades absolutas no século passado, mas esse cenário tem mudado gradativamente com o aparecimento de novas formas de divulgação de informações. A grande mídia, formada por oligopólios econômicos, tem perdido cada vez mais credibilidade ao difundir imagens manipuladas e parciais como se fosse um neutro retrato da realidade. Um bom exemplo dessa engrenagem ideológica foi a cobertura das manifestações de junho de 2013. Num primeiro momento, boa parte da mídia (TV, jornais, revistas) apresentava um recorte da situação e colocava os manifestantes como um pequeno grupo de baderneiros ou vândalos. Por outro lado, na internet, a realidade era outra: as mesmas imagens da TV apareciam na internet com outro enquadramento, outa manchete, outra verdade. Além disso, as imagens da mídia independente chegavam antes na internet e eram replicadas com rapidez. Assim, quando imagens semelhantes chegavam a TV, a informação já havia circulado pela rede e geralmente com matérias muito diferentes daquelas apresentadas pelos grandes grupos de comunicação: as mesmas imagens, mas múltiplas mensagens. Naquele contexto, as informações da grande mídia sempre pareciam velhas, por sua distância da fluidez das manifestações.
Podemos também retomar a recente Campanha Presidencial no Brasil e a clara preferência das tradicionais empresas de comunicação pelo candidato Alceio Neves. Alguns veículos publicaram editoriais explícitos justificando seu apoio e, no caso da revista "Veja”, houve até a antecipação da sua distribuição, nas vésperas das eleições, com uma capa onde fazia graves denúncias contra a  presidente Dilma Rousseff, então candidata a reeleição.
Na era pré-internet e pré-redes sociais, esta capa e a sua imagem teria feito um grande estrago  para a campanha da candidata, mas não foi o que se observou. Rapidamente na internet a capa da revista começou a ser satirizada e a mesma imagem teve várias interpretações diferentes, o que pode ter levado as pessoas a questionar a veracidade da informação, da imagem de capa e dos fatos que ali estavam sendo relatados. Dilma Rousseff venceu as eleições mesmo tendo contra ela esse ataque de um forte veiculo de mídia no Brasil.
No contemporâneo, a exclamação parece perder espaço para as interrogações e já não é mais possível afirmar que uma imagem vale por mil palavras. Agora, talvez seja mais apropriado dizer que uma imagem gera mil palavras, mil interpretações e mil possibilidades sem fim. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAUMAN, Zygmunt. 44 cartas do mundo líquido moderno. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2011

SARAMAGO, José. O homem duplicado. Lisboa: Editora Caminho, 2002







ANEXO:
PROGRAMA PERFORMATIVO

Uma imagem vale por mil palavras?

Instrução -1
Um  grupos de 5 pessoas (caso tenha mais pessoas pode ser criado novo grupo de 5 ou dobrar as funções dos atores no grupo: dois fotógrafos, dois escritores). Cada grupo precisa ter:

Uma dupla  sujeitos da ação;
Um fotógrafo;
Um escritor (jornalista);
Um homem da lei –(este deve criar regras enquanto observa todos  os outros).

Instrução -2

1- Fotógrafo:
Deve registrar tudo que os sujeitos da situação fazem e criar sua própria narração imagética para os fatos, planos, detalhes, enfim, criar uma narrativa para o que imagina que os atores estejam fazendo.

2- Escritor:
Deve escrever tudo que imagina que os sujeitos da situação estão fazendo, pode escolher qualquer tipo de narração: jornalística, ficcional etc. Não precisa se preocupar com a veracidade da historia.

3- Sujeitos da situação:
Devem criar uma situação entre si. Imaginar local, país, bairro, onde estão e a situação que se encontram  e quem são seus personagens. Devem combinar entre si a ação antes de saírem para o programa , pois durante o processo não podem conversar entre si nem com os demais atores.

4-Homem da lei:
Este deve observar o grupo e criar leis para suas ações. Ex: é proibido fotografar com a máquina na mão esquerda ou não pode escrever quando esta na escada.
Durante este processo o homem da lei apenas cria as leis observando a ação do grupo sem aplica-las ou comentá-las.

Instrução -3
Todo processo deve ser feito em silêncio. O grupo tem 20 minutos para  fazer a primeira parte do programa performativo.

 Retorno:

1-O fotógrafo da conta sua versão da história, sobre o que  viu e fotografou e exibe seu material para o grupo.
Os demais permanecem em silêncio.

2-O escritor apresenta sua versão para os fatos  oque escreveu sobre a ação dos sujeitos da situação.
Os demais permanecem em silêncio.

3-Os sujeitos da ação  contam o que estavam de fato fazendo.
 Os demais permanecem em silêncio.

Roda de conversa  com os sujeitos  da ação: eles contam o que estavam atuando e se esta  ação  corresponde as imagens do fotógrafo e a descrição do escritor.

 O homem da lei apresenta as regras (leis) criadas a partir da ação anterior .

Segunda saída:

 Instruções:

A ação é repetida pelo grupo com mudança de papéis nas funções. Quem foi fotografo pode virar escritor ou sujeito da ação ou homem da lei.

Agora teremos a aplicação das leis que foram cridas na primeira saída, exemplo:

Lei número 1-é obrigatório cantar para crianças.

Lei número 2 – ajoelhar toda vez que ver uma porta de vidro.

O homem da lei deve ter as leis escritas de forma legível  e claras. Estas leis quando apresentadas pelo homem da lei aos demais integrantes do grupo devem ser cumpridas imediatamente sem contestação e em silêncio.

Roda de conversa  os sujeitos  da ação, contam oque estavam atuando e se esta  ação  correspondem as imagens do fotografo e a narração  do escritor.

Imagens da ação:

Descrição do fotógrafo: “um casal de namorados   rindo no sofa olhando a postura de um segurança”. 
Imagem -1


Narração do escritor  : “são dois traficantes que estão muito loucos no CCJ.”

Imagem -2


Sujeitos da ação: “amigo e amiga rindo no  sofá do CCJ.”

Imagem -3



A lei aplicada:
Lei número 2 – ajoelhar toda vez que ver uma porta de vidro.
Imagem 4


Programa performativo “Uma imagem vale por mil palavras?” desenvolvido  e  aplicado durante os encontros do Programa Vocacional Artes Integradas, quartas feiras -horário: 14 as 17 horas-  CCJ Ruth Cardoso- mês de agosto, 2014 - artista orientador Valter Nu.


Uma imagem vale por mil palavras?
Programa 2

ATO SELF
“Narciso acha feio o que não é web cam”

Instruções:

1- Em lugar público o ator (sujeito da situação) deve escolher um local de passagem de grande fluxo de pessoas (rodoviárias, ruas movimentadas, shopping centers, estações de trem , metro, etc).

2- Deve pegar uma máquina fotográfica (precisa ser câmera fotográfica e não celular. Quanto maior melhor com lentes grandes e flash).

 3- Apontar a câmera para o próprio rosto e começar a clicar a própria face, fazendo poses, deve permanecer na ação por 25 minutos, não deve parar de se fotografar, deve permanecer em silencio, enquanto executa a ação.

Programa -ATO SELF “Narciso acha feio o que não é web cam”
Programa performativo desenvolvido e executado por Pedro Galiza e Eric AP- nos encontros de artes integradas do Programa Vocacional durante os meses de agosto e setembro – encontros as quartas feiras, horário:18 as 21 horas- CCJ Ruth Cardoso. artista orientador Valter Nu

Para ver: ATO SELF “Narciso acha feio o que não é web cam”



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