sábado, 22 de novembro de 2014

UM COMEÇO


Ensaio de Pesquisa Ação do Programa Dança Vocacional no Ceu Butantã
Artista Orientadora: Mariana Costa


Um início. A sensação de começar permeou todo o processo deste meu primeiro ano como artista-orientadora no Dança Vocacional. Assim como quando começamos uma criação, seja um texto, uma peça de dança ou um desenho, tudo está nebuloso, temos muitas ideias, desejos e dúvidas e não sabemos como começar a colocar no papel todo o turbilhão. E enfim, quando começamos, vemos que muitos destes desejos e ideias já estão presentes. Toda a vivência deste ano no vocacional foi muito potente, me provocou, questionou, desestabilizou, permitindo que eu crescesse muito como artista e arte-educadora.
É bem difícil elaborar e concluir o ensaio de pesquisa neste momento: estou nos últimos encontros com os vocacionados, concluindo nosso processo de criação para apresentação na Mostra do Dança Vocacional no Ceu Butantã no dia 15/11. Escrevo este texto no meio deste furacão que é o nascimento de uma criação, concluindo o processo vivido com os vocacionados durante todo o ano, sabendo que nunca se chega exatamente a um fim. Assim escrevo este texto de modo borbulhante, e talvez menos claro do que se o elaborasse daqui um mês, quando teria um distanciamento maior da experiência.
O que mais me moveu neste projeto este ano foi o engajamento dos meus artistas vocacionados com o nosso processo de criação. Vivencio com eles uma troca frutífera, na qual uma postura compromissada e dedicada ecoa em todos do grupo, composto por jovens de 14 a 20 anos, que me estimulam muito como artista-orientadora.
Em nossos encontros pude oferecer, além de técnicas e procedimentos da dança contemporânea, uma orientação do processo de criação em dança. Procurei desenvolver com eles algo que foi fundamental na minha formação como artista: incentivar/estimular o vocacionado a procurar informações que ampliem o seu repertório e orientá-lo em sua criação artística a partir de todas suas ideias e desejos. Ou seja, contribuir em sua emancipação como artista.
Nos primeiros encontros, no início do ano, o grupo tinha uma preocupação demasiada com o produto final, não valorizando o processo, o trabalho corporal, os procedimentos em dança, etc. Estavam mais preocupados em criar uma coreografia para a mostra e com os temas que gostariam de tratar. Ao longo do ano aprofundaram o contato com o próprio corpo, a partir de diferentes práticas, experimentando uma série de possibilidades em dança. Assim, ao longo do projeto, eles foram construindo juntos um produto que resulta do próprio processo que vivenciaram.
A criação que está sendo desenvolvida foi elaborada principalmente por eles mesmos a partir dos encontros, é composta por coreografias e com improvisações e composições criadas em tempo real. Todo o trabalho vem sido construído por eles e percebo que meu papel, ultrapassa o de trazer informações, se tornando cada vez mais, o de auxiliá-los na organização do material que eles mesmos trazem.
Quando começamos a pensar juntos o que eles gostariam de apresentar, uma vocacionada trouxe um trabalho que ela fez sobre fotografia de conflito, pois disse que o mesmo lembrava as composições que estávamos fazendo em nossos encontros. Ela apresentou para o grupo as fotos de Sebastião Salgado, principalmente as de Serra Negra. As fotos provocaram uma reflexão do grupo sobre a realidade que vivem: o racismo, a desigualdade social, machismo, entre outros, resultando na escolha das mesmas como inspiração de grande parte da criação coreográfica para a mostra final.
As fotos e a temática também estimularam a criação de um texto escrito pelos vocacionados (vide final do ensaio). Também criaram um vídeo, a ser veiculado na mostra, composto pelas fotos do Sebastião Salgado e por vozes em off  dos vocacionados recitando o texto desenvolvido.
Os vocacionados do Ceu Butantã participaram de várias ações culturais promovidas pela minha equipe, centro-oeste, e acredito que estas vivencias contribuíram muito para o seu crescimento e por todo seu engajamento. Uma destas ações foi o ciclo de seminários elaborado pela nossa equipe, coordenado por Yaskara Manzini, que contribuiu muito para refletir tanto sobre a dança em São Paulo no momento atual bem como sobre o dança vocacional, me enriquecendo e me auxiliando como artista-orientadora. Seria interessante se um maior número de vocacionados e artistas-orientadores e coordenadores das outras equipes pudessem ter participado mais destes encontros.
Ao longo do ano criei dois grupos no facebook. O primeiro “Dança Vocacional no CEU Butantã 2014!”[1] foi criado em junho e tinha como objetivo, além da divulgação, um espaço de trocas de referências para dança e para darmos continuidade a pesquisa além dos encontros no equipamento. O grupo foi se tornando uma ferramenta importante para todo o processo de criação com os vocacionados assíduos, de modo que criei em setembro um segundo grupo (este fechado inicialmente), intitulado “PROCESSO DE CRIAÇÃO_Dança Vocacional Butantã 2014” [2] para que eles pudessem trocar mais, postando vídeos e fotos de ensaios, reflexões, croquis das criações, entre outras informações importantes para a reflexão e escolhas sobre o processo de criação.
Enfim, este ano foi um gratificante começar: tanto para mim como artista-orientadora no vocacional como para os vocacionados, pois para a maioria deles foi o primeiro contato com a dança.
Segue abaixo o texto desenvolvido pelos vocacionados Bruna da Silva Ferreira de Andrade; Emelly da Silva Visgueiro Gomes; Marcos Paulo de S. Dias; Thainan Souza Silva e Vinicius Ruivo da Costa:

“UM DOCE OLHAR SOBRE A SERRA

Susto
olhar inseguro, de medo e vontade
como anda a ganância naquela região nordestina
sem água para beber
sem sofrer, sofrer por nada
gosto de barro pelo sangue derramado
derrotado de tanto cavar algo que é valioso
algo doce
o olhar triste da menina
onde todos os olhos da serra eram voltados para baixo
vemos aqueles acima que mandam nas pessoas

Coragem, olhar e vontade
gosto é a busca pelo ouro
pego através de uma luta
pela busca de uma riqueza natural
amarelo como o sol
que fica sobre as pessoas que trabalham
duro fotografar a situação das pessoas
mostrando a dança que está em seu coração
uma sensação de satisfação
procurar a felicidade na serra
é uma dança criada pelas
pessoas com vontade de conquistar algo”


E o vídeo realizado pela vocacionada Thainan Souza Silva que será projetado no trabalho realizado por eles: www.facebook.com/video.php?v=10204129970383605&set=o.284609838395666&type=3&theater



[1] “Dança Vocacional no CEU Butantã 2014!”: www.facebook.com/groups/dancavocacionalceubut2014/
[2] “PROCESSO DE CRIAÇÃO_Dança Vocacional Butantã 2014”: www.facebook.com/groups/284609838395666

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