UM COMEÇO
Ensaio de Pesquisa Ação do Programa Dança Vocacional no Ceu Butantã
Artista Orientadora: Mariana
Costa
Um início. A
sensação de começar permeou todo o processo deste meu primeiro ano como
artista-orientadora no Dança Vocacional. Assim como quando começamos uma
criação, seja um texto, uma peça de dança ou um desenho, tudo está nebuloso,
temos muitas ideias, desejos e dúvidas e não sabemos como começar a colocar no
papel todo o turbilhão. E enfim, quando começamos, vemos que muitos destes
desejos e ideias já estão presentes. Toda a vivência deste ano no vocacional
foi muito potente, me provocou, questionou, desestabilizou, permitindo que eu
crescesse muito como artista e arte-educadora.
É bem difícil
elaborar e concluir o ensaio de pesquisa neste momento: estou nos últimos
encontros com os vocacionados, concluindo nosso processo de criação para
apresentação na Mostra do Dança Vocacional no Ceu Butantã no dia 15/11. Escrevo
este texto no meio deste furacão que é o nascimento de uma criação, concluindo
o processo vivido com os vocacionados durante todo o ano, sabendo que nunca se
chega exatamente a um fim. Assim escrevo este texto de modo borbulhante, e
talvez menos claro do que se o elaborasse daqui um mês, quando teria um
distanciamento maior da experiência.
O que mais me
moveu neste projeto este ano foi o engajamento dos meus artistas vocacionados
com o nosso processo de criação. Vivencio com eles uma troca frutífera, na qual
uma postura compromissada e dedicada ecoa em todos do grupo, composto por jovens
de 14 a 20 anos, que me estimulam muito como artista-orientadora.
Em nossos
encontros pude oferecer, além de técnicas e procedimentos da dança
contemporânea, uma orientação do processo de criação em dança. Procurei desenvolver
com eles algo que foi fundamental na minha formação como artista:
incentivar/estimular o vocacionado a procurar informações que ampliem o seu
repertório e orientá-lo em sua criação artística a partir de todas suas ideias
e desejos. Ou seja, contribuir em sua emancipação como artista.
Nos primeiros
encontros, no início do ano, o grupo tinha uma preocupação demasiada com o
produto final, não valorizando o processo, o trabalho corporal, os
procedimentos em dança, etc. Estavam mais preocupados em criar uma coreografia
para a mostra e com os temas que gostariam de tratar. Ao longo do ano aprofundaram
o contato com o próprio corpo, a partir de diferentes práticas, experimentando
uma série de possibilidades em dança. Assim, ao longo do projeto, eles foram
construindo juntos um produto que resulta do próprio processo que vivenciaram.
A criação que
está sendo desenvolvida foi elaborada principalmente por eles mesmos a partir
dos encontros, é composta por coreografias e com improvisações e composições
criadas em tempo real. Todo o trabalho vem sido construído por eles e percebo
que meu papel, ultrapassa o de trazer informações, se tornando cada vez mais, o
de auxiliá-los na organização do material que eles mesmos trazem.
Quando
começamos a pensar juntos o que eles gostariam de apresentar, uma vocacionada
trouxe um trabalho que ela fez sobre fotografia de conflito, pois disse que o
mesmo lembrava as composições que estávamos fazendo em nossos encontros. Ela
apresentou para o grupo as fotos de Sebastião Salgado, principalmente as de
Serra Negra. As fotos provocaram uma reflexão do grupo sobre a realidade que
vivem: o racismo, a desigualdade social, machismo, entre outros, resultando na
escolha das mesmas como inspiração de grande parte da criação coreográfica para
a mostra final.
As fotos e a
temática também estimularam a criação de um texto escrito pelos vocacionados
(vide final do ensaio). Também criaram um vídeo, a ser veiculado na mostra,
composto pelas fotos do Sebastião Salgado e por vozes em off dos vocacionados recitando o texto desenvolvido.
Os
vocacionados do Ceu Butantã participaram de várias ações culturais promovidas
pela minha equipe, centro-oeste, e acredito que estas vivencias contribuíram
muito para o seu crescimento e por todo seu engajamento. Uma destas ações foi o
ciclo de seminários elaborado pela nossa equipe, coordenado por Yaskara
Manzini, que contribuiu muito para refletir tanto sobre a dança em São Paulo no
momento atual bem como sobre o dança vocacional, me enriquecendo e me
auxiliando como artista-orientadora. Seria interessante se um maior número de vocacionados
e artistas-orientadores e coordenadores das outras equipes pudessem ter
participado mais destes encontros.
Ao longo do
ano criei dois grupos no facebook. O primeiro “Dança Vocacional no CEU Butantã 2014!”[1]
foi criado em junho e tinha como objetivo, além da divulgação, um espaço de
trocas de referências para dança e para darmos continuidade a pesquisa além dos
encontros no equipamento. O grupo foi se tornando uma ferramenta importante
para todo o processo de criação com os vocacionados assíduos, de modo que criei
em setembro um segundo grupo (este fechado inicialmente), intitulado “PROCESSO DE CRIAÇÃO_Dança Vocacional
Butantã 2014” [2]
para que eles pudessem trocar mais, postando vídeos e fotos de ensaios,
reflexões, croquis das criações, entre outras informações importantes para a reflexão
e escolhas sobre o processo de criação.
Enfim, este
ano foi um gratificante começar: tanto para mim como artista-orientadora no
vocacional como para os vocacionados, pois para a maioria deles foi o primeiro
contato com a dança.
Segue abaixo o
texto desenvolvido pelos vocacionados Bruna da Silva Ferreira de Andrade;
Emelly da Silva Visgueiro Gomes; Marcos Paulo de S. Dias; Thainan Souza Silva e
Vinicius Ruivo da Costa:
“UM DOCE OLHAR SOBRE A SERRA
Susto
olhar inseguro, de medo e vontade
como anda a ganância naquela região nordestina
sem água para beber
sem sofrer, sofrer por nada
gosto de barro pelo sangue derramado
derrotado de tanto cavar algo que é valioso
algo doce
o olhar triste da menina
onde todos os olhos da serra eram voltados para baixo
vemos aqueles acima que mandam nas pessoas
Coragem, olhar e vontade
gosto é a busca pelo ouro
pego através de uma luta
pela busca de uma riqueza natural
amarelo como o sol
que fica sobre as pessoas que trabalham
duro fotografar a situação das pessoas
mostrando a dança que está em seu coração
uma sensação de satisfação
procurar a felicidade na serra
é uma dança criada pelas
pessoas com vontade de conquistar algo”
E o vídeo realizado pela vocacionada Thainan Souza Silva que será projetado no
trabalho realizado por eles: www.facebook.com/video.php?v=10204129970383605&set=o.284609838395666&type=3&theater
Marcadores: CEU Butantã; Dança Vocacional, Equipe Centro-Oeste
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