O CEU É MEU QUINTAL
Ensaio Teatro Vocacional
Artista Orientadora: Lígia Helena de Almeida
Equipamento: CEU Rosa da China.
Turmas: Turma de quarta e de domingo. (Unidas em um mesmo
processo de criação).
A informação de que parte este
ensaio é simples e se dá no título. O CEU é meu quintal. Não todo e qualquer
CEU. Mais especificamente, o CEU Rosa da China. Ouvi um vocacionado usar esta
expressão quando contava de sua chegada em São Paulo do Piauí e visitava pela
primeira vez o equipamento aqui citado. Vislumbrado com o espaço, as quadras, a
piscina, o teatro, ele dizia: O CEU(céu) é meu quintal.
Afeiçoada pela expressão repito a
descoberta que se deu para mim no Programa Vocacional 2014: O CEU (Rosa da
China)é meu quintal, e até aqui, não tinha me apropriado dele. Moro em Santo
André, na divisa com São Paulo, de um lado do rio a região leste da Santo André
a que pertenço, do outro lado do rio, a zona leste de São Paulo a que o CEU
pertence.
Exatos 08 minutos de carro, 35 a
pé, e, infelizmente, não pude contar o tempo de bicicleta. Mas ainda hei de
fazê-lo.
Como disse, a informação de que
parte este ensaio é esta, apenas. Mas convenhamos queridos artistas
orientadores, coordenadores e vocacionados: quantos são os participantes da
equipe deste programa que estão nesta posição privilegiada? Quantas vezes não
atravessamos rios, jornadas de trem, metrô e ônibus, para chegarmos nos
equipamentos? E quantas e quantas vezes, esta jornada de chegada e saída não
torna mais difícil nossa acessibilidade em relação ao equipamento, à
coordenação, aos vocacionados?
Não estou aqui evocando nenhum
tipo de chamamento ao AO Vizinho, desvalorizando esta distância percorrida – a
troca entre artistas de diferentes regiões, a relação entre as diferentes
periferias que um AO de outra região pode trazer, a própria experiência do
estrangeiro em relação ao grupo fazem parte de um pensamento do programa a que
muito nos interessa.
Mas gostaria de reletar aqui as
fronteiras que consegui romper pela proximidade, a experiência que se deu para
mim, para esta turma de vocacionados e para este equipamento no ano de 2014 de
uma troca que – diante da precariedade estrutural em que nos encontramos – a
proximidade me permitiu alavancar.
Ação Cultural do Equipamento – Ação Cultural no Equipamento
Se o CEU Rosa da China é meu
quintal, ele não é o quintal do centro de São Paulo, o bairro Jardim São
Roberto se esconde na fronteira andreensse, o que dificultou nos últimos anos a
possibilidade de continuidade de um AO por mais de um ano e por conseguinte, a
geração de demanda pela pesquisa continuada e pelo processo de formação. Longe
de tudo e de todos, com uma demanda baixa e sem a estrutura física de
transporte para promover uma ação cultural com estes vocacionados fora do
equipamento não tive outra escolha senão aderir a programação cultural do
próprio equipamento. – É preciso dizer que no ano de 2014, copa, eleições, e
algum fantasma a que não temos acesso – a programação cultural dos CEUs ficou
bastante a deriva. Nosso encontro foi com a tentativa da coordenação de abrir
espaços para a comunidade. Portanto, encontramos um espaço em que inclusive a
minha ação como artista era bem vinda.
Moradora da região, participante
de grupos de teatro, orientadora de outros grupos estudantis da cidade,
consegui, num espaço que gerou um vínculo com a gestão e abriu portas aos
vocacionados, fazer uma ação cultural de dentro para fora, e não de fora para
dentro.
Três grupos de diferentes
enfoques teatrais – Cia. Ubumtu, grupo de teatro formado por ex-alunos da
Associação Vivarte que fica na comunidade da Juta, ao lado do CEU, Cia. Uma das
Três, grupo de Santo André contemplado pelo PROAC Primeiras Obras no ano de
2014 e dirigido por mim e o Teatro Singular, grupo estudantil de um colégio de
Santo André onde eu mesma já fiz teatro e dei aulas – vieram ocupar o teatro do
CEU e promover uma troca não só com os vocacionados, mas com a comunidade do
CEU.
Posso dizer do meu receio em
promover estes encontros e, ao mesmo tempo, isentar o Estado da sua obrigação
de promover a ação cultural em seus espaços, mas não posso negar a
potencialização que se deu na relação com equipamento pelo encontro artístico,
pelo entendimento de que havia um pensamento artístico conduzindo um processo
no Vocacional Teatro e que se deixava claro por meio daquele material e não
apenas de um discurso.
“Um processo de ação cultural resume-se na criação ou organização das
condições necessárias para que as pessoas inventem seus próprios fins e se
tornem assim sujeitos, sujeitos da cultura, não seus objetos.”
Teixeira Coelho
Me parece aqui que o processo de
ação cultural se deu pelo encontro com o teatro e não pelo discurso solitário
de uma Artista Orientadora que não consegue dar a ver o teatro de que se fala.
A Ação Cultural do Equipamento e a Ação Cultural da Equipe
Importante dizer que um destes
encontros – o do Teatro Singular com seu espetáculo Por enquanto Antônio – teve estrutura de transporte para que
pudessemos convidar todos os vocacionados da equipe leste 2. Esta ação
conjunta, este encontro de vocacionados com artistas de um grupo estudantil e
com a experiência teatral em si. Na roda final a percepção de que os temas se
coincidiam, se refletiam, se identificavam entre si. A possibilidade de uma
fruição estética não pela forma, mas pelo discurso. Como Teixeira disse, uma
ação como possibilidade de tornar os vocacionados sujeitos da cultura e não
seus objetos.
A partir deste encontro os
próprios vocacionados manifestaram o interesse e a vontade de promover mais
encontros entre os CEUs da equipe. A ação cultural ganhou braços, os
vocacionados romperam as fronteiras, as trocas começaram a surgir. A própria
coordenação do equipamento abriu espaço para estes encontros. A estética de um
grupo invadiu a criação de uma turma, o pensamento de uma turma ganhou voz em
um grupo.
Ana, por que não meninas?
De todas as potentes
reverberações que estes encontros geraram não as tenho nas mãos, não posso
enumerá-las, seria dominar demais a ação cultural, “dirigí-la” como diz
Teixeira.
Mas posso dizer do processo que
se abriu na turma do CEU Rosa da China. Ela ganhou corpo, aglutinou um possível
coletivo, não o teatral especificamente, isto também seria dirigí-lo, mas um
coletivo de pensamentos e ações que se dão pela linguagem do teatro.
Nossa Ana (personagem criada por
eles que vinha à cena para lutar pelos direitos dos homossexuais) rompeu o
discurso primário do orientador e foi buscar o seu discurso, a sua vontade. As
primeiras cenas, profundamente enbasadas na referência cinematográfica
holywoodiana, foram se transformando em um processo mais autoral e apropriado.
As portas estão abertas, a
vontade da continuidade está dada. Fica a espera pelo tempo que não há.
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