sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

CARTA ÀS GESTÕES.

Eu, Lucila C. C> Leal, R.F. 824.957.1/1 – Func. Púb.: Assist. Téc. I, no CEU Inacio Monteiro – no dia 06/10/2015, no meu trabalho fui agredida verbalmente por Natália Siufi Rizzo, prof de teatro vocacional que lecionava na biblioteca e quando o local foi fechado passou a exigir as chaves para permanecer lá, no entanto por ordem da Coordenação a chave não poderia ser entregue. (...) TIPO DE BOLETIM: INJÚRIA / PROTOCOLO1243888/2015 SITUAÇÃO: PENDENTE PARA ANÁLISE.

Trabalhar é árduo, é modificar a natureza das naturezas, produzindo facilidades, produzindo movimento, transformar algo, alquimia, arte, labor, labuta. É preciso ser astuta, ser ligeira, ser certeira. Não se deve trabalhar perto demais dos que deveriam estar trabalhando mas preferem não o fazer. O trabalho quando é feito em sua radicalidade produz mudanças significativas. É perigoso mudança significativa em ambientes que não desejam e não possibilitam mudanças.
“Tudo está como deveria. Tudo no seu DEVIDO lugar. Não se mova! Não se mobilize! Assim, corre o risco de movimentar os outros e outras e de começar a ter que mover o ambiente, o espaço, o bairro, as pessoas. Pobre não foi feito pra pensar. Pobre não foi feito pra mexer, mas pra obedecer. Disso vive o sistema. Aula de teatrinho pode. Oficininha a gente deixa. E tem que ter um resultadozinho bem bonito pra gente mostrar que a gente tá fazendo. Emancipação? Autonomia? Consciência? Por favor! Falemos de outras coisas, não é mesmo? O que a gente quer é professor e aluno, no masculino e no singular.”
Como arrebentar as paredes de concreto e cimento que se instalam nos quatro cantos de seu “locus” de trabalho? Não fazer o pacto da mediocridade e exigir seus minutos, seus segundos, seus centésimos de trabalho, na profundidade que o trabalho exige. Sem se dobrar ao livro de ponto, ao número de horas-cartão, ao cumprir de um “ensaio-pesquisação”. Tanto nome bonito, tanto conceito complexo, tanto trabalho pra construir o que chamamos de PROGRAMA. 12 anos.
Luta. Luta. Luta. De muita trabalhadora da cultura que perdeu suas horas-lazer ou horas-livre pra debater em sala, pra pleitear em gabinete, pra manifestar em rua, pra exigir do orçamento. Pra quê? O que significa hoje o que fazemos, pra cidade? Numa cidade dura, onde não se é possível caminhar tranquilo, onde ninguém quer sair de suas casas, onde a mídia e o medo engessam o ser-humano atrás das fechaduras. E mesmo assim, mais de 200 escolas ocupadas, mostram e continuarão mostrando que o que tem força, mobiliza. O que produz significado, não morre. O que é verdadeiro, se espalha, se multiplica e se alastra.
Educar é algo de muita responsabilidade. O teatro depende da experiência concreta, depende de seres-humanos, de trabalho, de troca, de suor.
Sim, exijo a chave, exijo cada segundo do meu tempo curto no meu espaço pouco na minha semana apertada no meu encontro possível. Exijo tempo pra fazer nada, pra não pensar, pra não produzir, pra não apresentar. Tempo pro ócio, pra experimentação, pra pesquisa. Sabe o que é pesquisa? E não se espante, de saber que a pesquisa não começa e nem se resume às seis letras que escrevem GOOGLE. Isso não é um ensaio. Ensaio necessita de tempo, de espaço, de pessoas. Isso é um desabafo. É um pedido de socorro. Estamos sendo massacrados. Estamos sendo enlatados, formatados, em duas/três horinhas semanais, em reuniões pseudo-pedagógicas, em artigos-memórias-revistas que não falam nada a ninguém/ Não se comunicam com quem precisa ouvir, apenas com nós mesmos, pra nós, de nós pra nós mesmos. Cansei de palavras bonitas, de discursos de academia falida, de norteadores que me deixam desnorteada, de livros-pontos-horas-editais. Estou cansada e isso não quer dizer nada. Apenas que estou cansada.
Infelizmente o ser-humano revoltado sozinho nada pode fazer. Infelizmente ou felizmente, felizmente eu acho, as mudanças coletivas só se dão por trabalho coletivo. Trabalhar árduo, pra modificar a natureza das naturezas, produzindo facilidades, produzindo movimento, transformar algo, alquimia, arte, labor, labuta.
Este ano, o programa vocacional cresceu. Parece dar passos em direção a uma transformação. Devemos ter por certo que se as mudanças forem de fato inteiras, exerceremos na cidade uma função. Teremos força, no alastrar de nossas ações. Estaremos nos pondo a serviço dos nossos vocacionados, à serviço dos trabalhadores que pagam os impostos que pagam nosso salário. Isso significa passar por cima de muitas individualidades. Fazer escolhas, a cada minuto.
Eu exijo a chave. Ela exije a chave, Elas exigem a chave. Nós exijimos as chaves. Queremos abrir as portas, todas. Derrubar os muros, senhor Haddad, assim como o senhor. Derrubar os muros das burocracias, das hierarquias que nos distinguem dos senhores da educação, como se cultura fosse menos importante já que seu orçamento é infinitamente inferior.
A sua burrocracia me anula e não faço pacto de mediocridade com mais ninguém. A sua intolerância, a sua arrogância, a sua certeza, mata meu espaço do vazio, que é necessário pra criar algo que não seja imposto ou coreografado. Improvisar sempre começa com um sim, e só tenho recebido nãos. O purgatório equipamento cultural é cerceado, é lacrado, vendido, leiloado: musicais da cinderela disputam pedaço com shows de talento e alugueis para formatura. Estamos à venda!
Quem dá mais?
O espaço público tem dono e o dono carrega as chaves que abrem as portas do CEU.
Há tempos deixei de ser cristã. Há tempos venho descobrindo formas de viver mais com menos. Abandono o que me aprisiona. O que me paralisa. Abandono pra construir em outros espaços. Abandono confiante de que pulsam em seu pulsar múltiplas potencias, arrebanhadas em assembleias e mais assembleias, de construção em construção, sempre coletiva. E às camaradas, e aos camaradas, que ainda lutam e seguem na tentativa-trabalho, toda força, toda calma, toda potência. Estamos juntos.

“Um professor de filosofia foi ao sr. K. e lhe falou de sua sabedoria. Depois de um momento, o sr. K. lhe disse: "Você está sentado de modo incômodo, fala de modo incômodo, pensa incomodamente". O professor de filosofia se irritou e disse: " Não era sobre mim que eu queria saber, mas sobre o conteúdo do que falei". " Não tem conteúdo", disse o senhor K. " Vejo que anda grosseiramente, e não há objetivo que alcance ao andar. Você fala obscuramente, e nada esclarece ao falar. Vendo sua postura, não me interessa o seu objetivo."

Natalia Siufi Rizzo
Teatro
CEU Inácio Monteiro

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