segunda-feira, 24 de novembro de 2014

MANUAL IMPRÓVAVEL DE AÇÃO ARTÍSTICA ou COMO MONTAR UMA ENGRANAGEM ARTÍSTICA ou (ainda) COMO SER POTÊNCIA EM ATO NO PROGRAMA VOCACIONAL e (também) INSTRUÇÕES DE USO

MANUAL IMPRÓVAVEL DE AÇÃO ARTÍSTICA ou COMO MONTAR UMA ENGRANAGEM  ARTÍSTICA ou (ainda) COMO SER POTÊNCIA EM ATO NO PROGRAMA VOCACIONAL e (também) INSTRUÇÕES DE USO

Por Ieltxu Martinez Ortueta (Coordenador de Artes Integradas)

ma·nu·al 2 (latim manuale, -is, estojo de livro, livro pequeno) subst. masculino
1. Livro pequeno.2. Livro que sumariza noções básicas de uma matéria ou assunto. Compêndio. 3. Guia prático que explica o funcionamento de algo

INSTRUÇÕES DE MANUSEIO DESTE MANUAL

Este ensaio esta sendo desenvolvido para proporcionar ao leitor uma visão particular, conceitual e programática do que tem sido a experiência de coordenador da equipe Artes Integradas 2014 e ao mesmo tempo uma visão mais ampla sobre o que o autor deste manual entende por instaurar processos artísticos.

Para a elaboração deste ensaio esta sendo usado como modelo um manual de montagem de uma bicicleta de criança. Se teve uma tentativa de revisitar ao mesmo tempo O Manual do Guerrilheiro Urbano, escrito por Carlos Marighella em 1969, que ia ser aplicado como verbetes reconstruídos, assim que a redação deste manual precisa-se objetivar algumas questões, mas se acabou optando por deixar esse material de lado. Ficará por tanto na possibilidade não concretizada.

É necessário entender este ensaio como um manual de instruções, onde se prioriza o enunciado e a síntese. Trata-se, também, de um paralelismo formal com as proposições de Programa Performático de Eleonora Fabião que foram um impulso inicial na equipe Artes Integradas. 2014.

ATENÇÃO: Leia atentamente as definições sobre manual acima

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Chamo as ações performativas programas pois, neste momento, esta me parece a palavra mais apropriada para descrever um tipo de ação metodicamente calculada, conceitualmente polida, que em geral exige extrema tenacidade para ser levada à cabo, e que se aproxima do improvisacional exclusivamente na medida em que não sera previamente ensaiada. Performar programas é fundamentalmente diferente de lançar-se em jogos improvisacionais. O performer não improvisa uma idéia: ele cria um programa e programa-se para realizá-lo (mesmo que seu programa seja pagar alguém para realizar ações concebidas por ele ou convidar espectadores para ativarem suas proposições). Ao agir seu programa, desprograma organismo e meio.

Eleonora Fabião Performance e Teatro: poéticas e políticas da cena contemporânea

A)  PEÇAS CHAVE PARA A ORIENTAÇÃO

1-Afirmar o processo artístico como eixo fundamental do trabalho nas reuniões artístico-pedagógicas e no trabalho de orientação nos equipamentos.

2-Estabelecer como linha de investigação fundamental o PROCEDIMENTO, a elaboração de dispositivos concretos onde o enunciado e a síntese norteiam a proposta. Para isso não é necessário estar atrelado a uma forma (linguagem) artística concreta e sim ao conceito que se deseja explorar.

3-Instaurar como dispositivo concreto para a troca de procedimentos entre os integrantes da equipe o recorte temático IDENTIDADE e/ou PERTENCIMENTO. Todos os artistas da equipe apresentaram um procedimento e/ou material que dialogava com essa questão.

4-Propor um diálogo horizontal entre os artistas envolvidos na equipe Artes Integradas, na expetativa de estabelecer um diálogo rico e aprofundado das diferentes formas de ver o processo artístico.

5-Firmar um acordo no qual cada artista envolvido tem a experiência, o profissionalismo e o olhar crítico aguçado suficiente para trazer para si a responsabilidade de estabelecer critérios de atuação e gerir de forma autónoma cada processo artístico.

6-Colocar a função de coordenação num patamar artístico exigente de problematizar, verticalizar e ampliar as possibilidades apresentadas pelos integrantes da equipe.

7-Estabelecer a auto-avaliação e reflexão em processo continuo entre os dois coordenadores, problematizando escolhas, procedimentos, atuações e desvios dentro da equipe.

B) CUIDADOS COM A FERRAMENTA/ENGRENAGEM
-Verificar periodicamente se todos os parafusos e porcas que fazem a engrenagem/desejo de estar no Programa Vocacional estão no seu lugar.
-Observar se o posicionamento de todos os componentes artístico pedagógicos e a ação artística efetiva estão alinhados com o discurso.
-É aconselhável o uso de roupas de trabalho tipo macacão para não ter problema (nem medo e/ou receio) em se sujar e estar disponível para constantes possibilidades de atuação. Esse tipo de roupa ajuda na melhor visualização das propostas do artista e permite não correr o risco de alguma peça do vestuário engatar na engrenagem do processo.
-Lembre-se de que a atuação artístico-pedagógica é um veículo, um potencializador, um catalizador de desejos e potencias.
-Manter as mãos sobre o guidão do processo com convicção, mas não tenha receios em eventualmente se desequilibrar ou pegar uma estrada esburacada.
-Entrar em baixa velocidade nas curvas fechadas sem visibilidade, mas mantenha a atenção na paisagem geral, para conseguir ter uma amplitude maior da função de guiar a engrenagem.
-Não evite andar em fila dupla/tripla ou quadrupla, siga os combinados de trânsito que se estabelecem em equipe, mas não hesite em interferir, acrescentar e problematizar a engrenagem/atuação de outro artista.
-É preferível e necessário manter-se a esquerda e pensar além do possível, sem medo de errar. Não leve em consideração trilhar o caminho junto ao meio fio, corre grave risco de ficar no meio do caminho.
-Uma vez que entrou na equipe, sinalize com as mãos, com o corpo inteiro ou como achar pertinente quais são os motivos de estar ai, os achados do percurso e os eventuais problemas, indicando ora à esquerda ou à direita mas nunca ficando em uma posição neutral ou impassível, no meio fio.
-Não ultrapasse, não faça atalhos ou se use de pretextos e justificativas da esfera pessoal, junto a equipe, ao final todos temos essas questões e é impossível estabelecer qual motivo é mais importante que outro. Se esse caso acontecer, apresente uma proposta ou banque sua decisão mas não caia na armadilha de querer justificar determinada ação em comparação a outro membro da equipe.
-Lembre que pegar na rabeira com justificativas e correlatos só enfraquece a capacidade de analise e auto-crítica do processo.
-Evite ir de carona, pois seu processo é um veiculo individual ainda que necessariamente compartilhado em equipe. Levar outras pessoas no bagageiro ou na garupa é desaconselhável, incomodo e oferece riscos inecessários para a saúde e o andamento da engrenagem geral.
- O proprietário/propositor do processo deve ter por responsabilidade evitar que burocratas /ou pessoas sem desejo de potência tenham contato ou efetuem qualquer manuseio das engrenagens processuais, são correntes dentadas cortantes por natureza.

ATENÇÃO:
A garantia da montagem deste arte-fato fica automaticamente invalidada caso:
-Este manual seja seguido ao pé da letra.
-O fato de tentar buscar algum utilidade tecnicista ou querer encontrar alguma resposta utilitária
-Não forem observadas as especificações e recomendações deste manual.

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Há trezentos anos, pelo menos, a ditadura da utilidade é unha e carne com o lucrocentrismo de toda essa nossa civilização. E o princípio da utilidade corrompe todos os setores da vida, nos fazendo crer que a própria vida tem que dar lucro. Vida é o dom dos deuses, para ser saboreada intensamente até que a Bomba de Nêutrons ou o vazamento da usina nuclear nos separe deste pedaço de carne pulsante, único bem de que temos certeza.
                                                   Paulo Leminski em Inutensílio


                                                                             


                                             Em São Paulo, 21 de novembro de 2014




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