quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Sobre a escrita de si a partir da Pergunta-que-move



Zona Sul, Ceu Caminho do Mar. Teatro. Linguagem de algum lugar. Vocacionad@s.
Pergunta que move. O rio.
Da trajetória das impermanências e a partir daquilo que se pergunta, os vocacionados dali se projetaram para a escrita de si mesmos, em suas dramaturgias autorais. Sofisma ou utopia? Prefiro utopias, são refrescantes, e nunca saem de moda. Bem ao contrário da aparência de intelectualidade morna que nunca sacoleja nem rumoreja paisagens. Mas falarei depois sobre a carcaça ideológica.

Descobri no fazer-ação um modo insólito de desvelar as camadas do outro. Quando eu te pergunto: qual tua pergunta essencial? Ou “o que você acorda todo dia com vontade de perguntar À Vida?” - que pensamento-sensação bruta, despontou em seu lábio-mente??

Pois acho que é daí mesmo que surgem as grandes construções dramatúrgicas, os grandes textos. Grande pode ser só uma frase e durar 2 minutos em cena. Grande pode ser um gesto no ar. Grande é a luta dos corpos- todos os nossos, para sobreviverem á labuta econômica-social, e ainda chegar à noite com disposição de fazer UM GRANDE ENCONTRO, assentir com o imprevisível, e com o outro. Quando dizemos: encontrar com o novo” ... percebo que estamos de novo, buscando O MESMO... porque esteve sempre ali, não esteve? E porque não reparei daquela vez, e sim hoje?? Mas O MESMO nunca é o ÓBVIO. O mesmo aqui pode ser algo além dentro de si. Apaixono-me com a possibilidade de uma pessoa vir a transformar-se nela mesma. 

Descascando nós próprios através da escrita. Só precisaríamos de mais 7 meses e meio de projeto para dar conta de todos os olhares, textos, poéticas, urgências, materialidades, linguagem, trocas com comunidade e público, e um a um, tocar o devir cênico que surgiu diante de nós a cada vez.
Fico tão gratamente surpresa ao perceber que TODOS escrevem. Todos buscam LINGUAGEM. Dizer isso não significa que todo mundo tá cheinho de ideia, e isso pressupõe que elas, de cara, sejam BOAS IDEIAS, e também isso faz supor idealmente, que todo mundo tá louquinho de vontade de só SE expressar, de mostrar ao mundo a que veio, de berrar sua autoafirmação. Nãoooo...

Eu ainda não sei porque vim ao mundo nem porque quando cheguei já tava tudo desse jeito.
Eu também não posso afirmar o destino exato de uma cena, de um poema, de uma carta. Muito menos de uma nação, que dirá de um espetáculo!
Eu só posso buscar LINGUAGEM.
Quando se busca linguagem, também está se buscando o onírico. Porque linguagem É invenção. Pode ser só reprodução também, mas isso fica a critério do cliente. Nessa viagem urbanoide tresloucada, todo mundo arrisca e afia linguagens. O tempo todo. Nisso tudo eu desconfio que ainda sejamos escravos do ouvido, e só damos atenção (bem pouca, diga-se de passagem) ao que é verbal. O que é PRESENÇA, nós somos educados desde cedo a ignorar. Ou temer. 

Escrevendo, sou obrigada a lançar possibilidades. A vasculhar memória, política, delírio e poesia. Tudo dentro e junto. E depois fora, e também sozinho. EM CENA. Nesse processo de escrever o próprio texto, a conceber a própria cena/encenação, a buscar solucionar/experimentar outras materialidades plásticas, a rever a estética da minha questão cênica (sonoridade, produção, presença, contexto, etc.), reconheço que escrever uma cena a partir da questão-que-move produz uma certa repercussão na pessoa, que é imediatamente política, social, cidadã, poética e intransferível. Pois se recriam mesmo realidades. Muita atenção nessa hora, pois acredito que não está claro para a “humanidade” que recriar realidades não é de forma nenhuma APONTAR SOLUÇÕES... Nós só suspeitávamos, a partir de alguns estudos sobre dramaturgia e encenação, o que NÃO é papel de uma cena: fazer proselitismo, defender ou acusar unilateralmente, abdicar do corpo, cristalizar ou tentar impor “verdades”, acreditar que a voz racional é a única a ter legitimidade, reproduzir limbos emocionais, entre outras coisas difíceis de definir, porém igualmente muito presentes, tanto quanto o desejo de falar. (sim, só mais 7 meses-só mais sete meses, por favor...)
Obs 1: Até o momento, Recriar realidades pressupõe paradoxos, indagar, pesquisa e elaboração poético-corpórea.
Talvez isso dê uma pista para elucidar e também quem sabe, recriar os comportamentos. Porque, na atual Sociedade do Medo, há tantos açoites, mais temidos que sentidos, tanta palavra bonita não dita e desejada, TANTO corpo por aí sem ideia de que é um corpo, que olha.... Melhor não dizer. Melhor OLHAR melhor. Melhor perceber...

Observação intermitente:
Manifesto nº 20.231, em prol do Risco Para Todos, ou #Deixa eu sair da carcaça ideológica por favor!
Porque para surgir LINGUAGEM é necessário parir paradoxos.
Uma cena não se sustenta com moral. Isso já sabemos.
Não se sustenta um texto sem dialética. Isso quase sabemos.
“Mas não peça para eu sair da minha carcaça ideológica que daí eu me ferro mesmo. Como vou sobreviver??”
Risco na cesta básica do brasileiro. Mas não o famoso risco social, da vulnerabilidade diante da omissão, do descaso ou ódio. Não ESTE risco da sujeição abjeta e injusta.
Por uma necessidade da desproteção e de desarme, depor a carcaça dos grandes marcos ideológicos por alguns minutos diários, para uma ação de fusão-alquímica com a realidade. 

É humanamente impossível zerar nosso repertório (intelectual/físico/psicológico/sexual/ etc). 

Só é possível subverter a carcaça, se pudermos delirar a linguagem. Se propondo até à aparente idiotia, ao Risco, a ser Stalker de sua própria Zona, à dizer para a Grande-Voz-do-Filósofo-E-Crítico-Social que baixa em nosso ouvido no centro espírita: agora não. Deixa eu viver primeiro.” 

“Eu me distancio de todo ser que eu nunca vi chorar. Eu nunca assisto filme ruim porque é de graça. Eu reservo para o amor e o futebol as minhas melhores contradições.” (M.R.) 

No âmbito artístico, considero que cada vez mais, na ânsia de apagar os fogos de artifício dos criadores ou na preocupação em delimitar os rígidos limites profissionais, as pessoas (cada vez mais) aumentam consideravelmente a distância da ponte que os liga. É uma época muito banal essa em que se pode morrer de desespero ao lado do seu mais fiel amigo. A questão posta não é de “respeito ao tempo do outro” ou à noção não idealizadora que cada um deveria fazer de seu oficio e de sua competência. Porque também não se deve amassar o ossinho de Complexo de Atlas. Torna-se necessário tirar dos ombros este perverso fardo social, ser inversamente Jesus. 

Eu só me pergunto porque estava ali do lado, e não percebemos...Porque?
Enquanto organizo roteiros, canovaccio, textos, colagens, me dou conta de que não há ordem possível. Colocar uma cena na frente de outra, é sem dúvida, só ir pelo caminho do acaso... porque os filetes dos rios são numerosos, fartos, e extensos... Eu caminhei seguindo o rio, até perceber que estava mergulhada inteira nele. “O rio debaixo do rio” (Clarissa Pinkola Estés).

Desse rio, bebo. Desse rio, falo agora. Desse rio debaixo do riso e das sobrancelhas arqueadas.  
Dos fluxos aparentemente desordenados, puramente caóticos ou sem sentido, brotam as Escritas Emergentes a partir de si mesmo. Se dando conta, de repente, que o si mesmo é um mundo. 

Este. 



Mônica Rodrigues/ Programa Vocacional /Teatro-CEU Caminho do Mar
Novembro/Outubro/Setembro- 2014

Marcadores: , , , , ,

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial